Manuel Maria Gonçalves
Manuel Maria Gonçalves
CEO da APPII

Habitação: construir confiança antes de construir casas

08/10/2025

Agora, cabe-nos refletir, com serenidade, sobre aquilo que é preciso fazer para transformar estas boas intenções em resultados objetivamente positivos para os portugueses e, assim, para o país.

Todos sabemos que a designada crise da habitação é complexa, existe há demasiados anos e a sua resolução exige visão de longo prazo. Infelizmente, o setor tem sido marcado exatamente pela ausência total dessa visão dos responsáveis políticos que, governo após governo, não têm, como se constata, sido capazes de apresentar medidas eficazes. A legislação e as orientações políticas mudam constantemente e, demasiadas vezes, o racional por detrás dessas mudanças é guiado por ideologia e não por resultados efetivos na melhoria do acesso à habitação.

Ora, é inegável que este modus operandi compromete a credibilidade e a estabilidade necessárias para um mercado mais atrativo. E não nos enganemos: não há soluções milagrosas. Além do elementar know-how, resolver um problema estrutural desta dimensão exige à nossa classe política coragem, ambição, perseverança… e não só.

Ora vejamos, como se pode contribuir para a criação da confiança e visão necessárias, para combater esta crise em cinco princípios essenciais:

Em primeiro lugar, é essencial reconhecer que a ideologia não constrói casas. O diálogo, a cooperação e o trabalho conjunto e permanente entre o setor público e o setor privado — esses sim — constroem. A APPII tem defendido que essa cooperação é a chave para um mercado mais equilibrado, acessível e competitivo.

Em segundo lugar, é fundamental garantir previsibilidade e confiança. A estabilidade legislativa é o cimento que sustenta o investimento, nacional e estrangeiro. Sem regras claras e duradouras, não há confiança, nem investimento, nem condições para o crescimento.

Em terceiro lugar, é urgente combater a burocracia que paralisa o país. A lentidão dos licenciamentos, os pareceres sucessivos, os entraves administrativos e a falta de coragem para decidir — porque nenhuma decisão é simples — travam o desenvolvimento, aumentam custos e afastam quem quer investir e construir. Precisamos de uma administração pública ágil, digital, colaborativa e orientada para resultados concretos.

Em quatro lugar, assume-se ser crucial dar tempo às políticas para produzirem efeitos reais. Quatro anos é um ciclo político — não é um ciclo de transformação estrutural. As medidas devem ser avaliadas com base em dados e resultados concretos, e não em perceções ou ideologias.

Em quinto e por último, devemos aprender com quem já encontrou caminhos eficazes. Não é preciso reinventar o setor. Basta observar exemplos próximos, como por exemplo Madrid, onde o público e o privado souberam cooperar para criar soluções rápidas e sustentáveis.

Estes cinco princípios devem guiar sempre a classe política e o legislador na definição e execução de qualquer medida para o setor.

No plano de implementação das medidas agora anunciadas, é essencial garantir que cada uma delas (1) não é ditada por ideologia, mas por evidência, (2) reforça a confiança e a previsibilidade, (3) simplifica e desburocratiza, (4) vigora tempo suficiente para permitir uma avaliação rigorosa e objetiva e (5) segue modelos que já provaram funcionar noutros países.

Sem isto, nenhuma medida resistirá ao tempo nem cumprirá o seu propósito.

Termino com uma certeza: ao celebrar este ano 35 anos de história ao serviço do setor e do país, a APPII renova o seu compromisso de sempre — continuar, com seriedade, determinação e convicção, a contribuir para construir e transformar Portugal.