Entre elas destacam-se a assinatura de uma linha de crédito no valor de 1.300 milhões de euros com o BEI para financiar habitação acessível, a criação de um prazo para que as entidades públicas justifiquem a não utilização de património do Estado, a criação de uma ficha única digital do imóvel e, finalmente, a clarificação de papéis das diferentes entidades públicas na área da habitação.
A injeção de financiamento através do BEI é um passo essencial. Não podemos falar de habitação acessível sem ter os recursos financeiros que permitam acelerar a construção e a reabilitação. Mas há um ponto central: Portugal precisa de aumentar significativamente o seu parque de habitação pública. As cerca de 120 mil casas existentes são manifestamente insuficientes; a aposta em duplicar o plano de habitação pública de 59 mil para 133 mil casas poderá constituir o maior investimento de sempre nesta área em Portugal. Mas importa lembrar que a capacidade construtiva instalada no país tem limites: atualmente, o setor edifica cerca de 26 mil casas por ano, trabalhando já no seu pleno. Sem reforço de meios e incentivos à cadeia produtiva, dificilmente se alcançará a escala necessária.
Outro eixo anunciado prende-se com o aproveitamento do património do Estado. A decisão de exigir às entidades públicas a justificação da posse de imóveis e, em caso de ausência de projeto, transferi-los para a ESTAMO, vai no sentido de pôr termo a um desperdício que o país não pode continuar a tolerar. O sucesso desta medida dependerá da agilidade com que estes imóveis possam ser, de facto, transformados em habitação disponível.
A criação da ficha única digital do imóvel, apresentada como o “bilhete de identidade” das habitações, é igualmente uma medida relevante. Quem já passou por um processo de compra, venda ou arrendamento sabe quão moroso e fragmentado pode ser reunir certificados energéticos, registos prediais, cadernetas prediais, alvarás de utilização, entre muitos outros documentos. A centralização digital desta informação representa uma verdadeira simplificação administrativa, que permitirá reduzir tempo e custos para os cidadãos e para as empresas. É um passo no sentido de modernizar o setor e torná-lo mais eficiente.
Importa também sublinhar a clarificação de responsabilidades anunciada. Durante anos, diferentes organismos acumularam funções de planeamento, regulação, gestão e execução, com evidentes sobreposições e ineficiências. A atribuição ao Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana de um papel de coordenação, ao Banco Português de Fomento da responsabilidade pelo financiamento, e às autarquias a gestão do património público habitacional, poderá trazer maior clareza.
A execução destas medidas acaba por ser o seu denominador comum. O histórico das políticas de habitação em Portugal mostra-nos que muitas vezes as intenções não se traduzem em resultados tangíveis à velocidade exigida. O primeiro-ministro admitiu que serão precisos anos para ver frutos. Mas é precisamente nesta discrepância entre a urgência sentida pelas famílias e a lentidão estrutural da resposta que reside a maior fragilidade do sistema. Não basta legislar, anunciar investimentos ou reorganizar competências, é fundamental que, num prazo razoável, as iniciativas propostas se materializem em mais casas disponíveis, a preços efetivamente acessíveis. Os anúncios do Governo são passos acertados, mas é a sua concretização que determinará o impacto concreto das mesmas. Esse sim é o verdadeiro teste que se coloca às políticas de habitação: transformar promessas em soluções.