Estado tem de ser responsável pela criação de instrumentos de política pública para garantir que as cidades são de todos

24/11/2021
Estado tem de ser responsável pela criação de instrumentos de política pública para garantir que as cidades são de todos

“O que falhou no desafio coletivo da habitação”, questionou Marina Gonçalves, secretária de Estado da Habitação, na sessão de abertura da IX Semana da Reabilitação Urbana do Porto, que decorre até amanhã, no edifício da Alfândega. “Falhou a posição do Estado central na promoção de políticas de habitação”, admitiu Marina Gonçalves. “E não falo apenas na necessidade da construção do parque habitacional público, que é de apenas 2% e é a nossa grande prioridade. Falo na criação de instrumentos para, a par da prioridade do investimento público, a resposta ser complementada pelos privados”.

Aqui, a nova geração de políticas da habitação, na opinião de Marina Gonçalves, veio definir esta prioridade da resposta pública às situações mais indignas no que à habitação diz respeito, onde o Programa 1.º Direito adquire particular relevância. “Aqui, os municípios são os parceiros fundamentais, já que são eles que identificam as necessidades, as respostas mais adequadas a cada agregado familiar e concretizam e executam essa política no terreno”.

Marina Gonçalves diz, assim, que o papel do Estado é ser corresponsável pelo financiamento destas medidas. “O que falhou foi precisamente isto: durante anos não fomos corresponsáveis pela criação destes instrumentos de política pública para garantir que as cidades são de todos”. O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), segundo Marina Gonçalves, veio precisamente robustecer essa oferta pública, dando a possibilidade de priorizar a habitação.

Porto é mais do que o centro

A requalificação e a reabilitação urbana, de per si, são áreas que não se esgotam dentro de um perímetro urbano, disse na sessão de abertura Ricardo Valente, vereador do pelouro das finanças, economia e emprego e pelouro do turismo da Câmara Municipal do Porto. O vereador explicou que, na cidade portuense, os primeiros passos na reabilitação começaram a ser dados no pós-crise de 2008, quando o centro histórico despertou o interesse do investimento privado, motivado por um novo regime jurídico, por um conjunto de benefícios fiscais e pelo crescimento consistente do turismo. “Neste momento, numa altura em que a requalificação e reabilitação do centro da cidade se encontra numa fase avançada, o que a Câmara do Porto tem feito é desenvolver mecanismos idênticos noutras zonas da cidade, mediante uma estratégia que discrimina positivamente territórios anteriormente proscritos, mas com enorme potencial de atratividade”, como por exemplo o investimento na zona oriental da cidade.

Mercado de rendas acessíveis

Um dos temas mais relevantes na atualidade é o tema da habitação, tão relevante que o PRR português destina à componente habitação de 2.733 milhões de euros (dos quais 1.583 milhões a fundo perdido), disse na sua intervenção. Com relação à oferta de habitação social, Ricardo Valente relembrou que a cidade do Porto “já é líder nacional com um peso de cerca de 13% sobre o património edificado da cidade, uma percentagem que coloca o Porto ao nível da Finlândia e que ultrapassa largamente os 2% da média nacional e os 5% propostos como objetivo pelo atual Governo”.

Ricardo Valente falou também na aposta na criação de um mercado de rendas acessíveis, onde o município tem desencadeado um conjunto de programas como o Porto com Sentido, a promoção de projetos totalmente públicos e de projetos público-privados. “Chamo a atenção que durante este mês lançamos um novo segmento do programa Porto com Sentido que permite a contratação de promessa de arrendamento em 200 fogos das dez áreas de reabilitação urbana da cidade (ARU)”.

Imobiliário não pode ser fonte inesgotável de impostos

Manuel Reis Campos, presidente da AICCOPN, alertou para a necessidade de fazer um balanço da reabilitação no nosso país, um percurso que classificou como “meritório para todos os agentes envolvidos, desde governos, autarquias e empresas” e que enfrentou desafios como a eficiência energética, a mobilidade sustentável ou a construção 4.0.

Apesar de tudo, Reis Campos fala num “longo caminho a percorrer para nos aproximarmos da realidade europeia”. Daí ser essencial, no seu entender, discutir as prioridades do PRR para o investimento em habitação. O presidente da AICCOPN abordou na sua intervenção o papel dos privados, a existência de um verdadeiro mercado de arrendamento e a criação de uma cultura de reabilitação urbana “são dimensões essenciais e incontornáveis”. Aqui, Manuel Reis Campos particularizou a reabilitação que, no seu entender, se encontra no cerne da estratégia de recuperação e resiliência da Europa. “A cidade do Porto é um excelente exemplo. A reabilitação nesta cidade constitui um mercado inovador e dinâmico”.

O presidente relembrou que é necessário ultrapassar obstáculos, dando como exemplo uma fiscalidade que não penalize o investimento e deixe de considerar o imobiliário como “fonte inesgotável de impostos”.