As mulheres na construção das cidades: “uma cidade plural é o mais importante”

03/03/2025
As mulheres na construção das cidades: “uma cidade plural é o mais importante”

Depois de décadas em que as cidades foram planeadas, idealizadas e construídas maioritariamente por homens, esta perceção vai sendo desconstruída, e as mulheres que fazem parte deste processo ganham notoriedade. Homens ou mulheres, na hora de planear e fazer cidade, pensar numa “cidade plural é o mais importante”. 

O papel das mulheres na evolução das cidades animou um dos debates da Semana da Reabilitação Urbana de Lisboa, numa sessão coorganizada pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, pela VI e pela WIRE – Women In Real Estate. Participando nesta mesa-redonda, a arquiteta Helena Roseta destacou que “temos de olhar para a cidade como uma cidade plural, isso é o mais importante, precisamos da diversidade e proximidade que a cidade exige na nossa vida quotidiana. A cidade é constituída pelos que nela viveram, pelos que nela vivem e pelos que estão a projetar o futuro”. Reconhecendo as grandes diferenças de sobrecarga de trabalho e tempo livre entre homens e mulheres, defende que “se a cidade fosse mais próxima e mais bem pensada, ao nível do planeamento económico e urbanístico, perdíamos todos muito menos tempo e seriamos muito mais felizes”. Por isso, remata que “tornar tudo mais habitável, mais próximo e aberto é o mais importante”. E lamenta que, no que toca aos representantes políticos que fazem cidade, este “ainda é uma espécie de clube privado dos homens. As mulheres entram em várias funções, mas não na hora de fazer listas, e é preciso lutar muito para inverter isto”. 

Também arquiteta, Inês Lobo defende que “continua a ser muito importante falar do papel da mulher seja onde for. Nas cidades, já não temos o papel das rainhas e das suas obras, e a cidade é uma invenção coletiva, nesse sentido, falamos de imensas mulheres. Mas é difícil autonomizar o papel destas mulheres neste coletivo”. No entanto, “sinto que estamos cada vez mais mulheres sentadas à mesa e em obra, felizmente”. 

Helena Lucas, Lucas, diretora do Departamento de Gestão Imobiliária e Património da SCML, destacou a “resiliência, adaptação e capacidade de fazer várias coisas ao mesmo tempo” das mulheres, “e á isso que a Santa Casa faz, tem capacidade de garantir e se responsabilizar por várias áreas, e consegue adaptar-se às necessidades da sociedade. E nos últimos anos tivemos várias situações fora do normal [pandemia ou guerra na Ucrânia]. Conseguimos dar a resposta necessária, de forma quase imediata”. E completou que “estamos sempre a falar de pessoas, desde o benemérito, aos que o recebem, aos que beneficiam. É assim que temos cuidado do nosso património”.

Margarida Caldeira, Head da Broadway Malyan Portugal, não vê um traço predominante masculino ou feminino no desenho das cidades, “tudo o que fazemos é para todos, e a responsabilidade é imensa, sejamos mulheres ou não”.

Sobre a questão do género no direito, a advogada Sofia Galvão, consultora sénior da PLMJ, afirmou que a legislação “não tem género, o urbanismo feito para servir uma realidade, e faz-se numa lógica muito disciplinar, nessa capacidade de conversar com todos”. O caminho de igualdade feito pelas últimas gerações “foi muito importante e pode, claro, evoluir e ser aprofundado, para não voltarmos para trás, mas é importante não nos aprisionarmos em discursos que dividem a sociedade em grupos de homens e mulheres. É na complementaridade que devemos estar, não uns contra os outros”.

Para Helena Roseta, “o direito e o urbanismo não têm género, mas o direito tem de ser sensível ao género e às desigualdades, tem de ser mais interativo e de abranger mais cidadãos, todos eles e de todas as cidades. E se a lei não tem género, quem a exerce tem [masculino], e isso marcou muito as cidades”. E alerta que “temos de manter esta abertura, principalmente no urbanismo”, apelando para que, no desenho dos novos planos diretores, “não fechem as opções para o futuro, deem espaço à vida”. 

Dar mais visibilidade ao trabalho das mulheres

Fechando este debate, Susana Pascoal, diretora de Marketing da VICTORIA Seguros, afirmou que “as mulheres também constroem as cidades, a questão é se têm a mesma visibilidade [que os homens]. A obra feita tem de ter a visibilidade merecida e o reconhecimento que lhe é devido”. 

Filipa Arantes Pedroso, presidente da WIRE Portugal, recordou que “a WIRE tem este objetivo de dar visibilidade às mulheres. Todas as nossas 85 associadas têm posições C-Level no setor imobiliário e são profissionais de excelência. Queremos contribuir para uma maior igualdade entre homens e mulheres. Porque temos maioritariamente visões masculinas nestes eventos e, de facto, as coisas podem andar para trás, e há ainda muito por fazer”, rematou.