É com um sentimento de incerteza que o mercado imobiliário português começa o ano. As influências da geopolítica e a crise da habitação marcam a agenda, mas os profissionais estão mais otimistas do que há um ano atrás.
“Perspetivas para 2025”, foi este o mote do Pequeno-Almoço Conferência que a revista Vida Imobiliária organizou na última sexta-feira em Lisboa, em parceria com o ISEG, convidando um conjunto de profissionais do mercado para partilharem a sua visão sobre este novo ano. Incerteza foi a palavra (e o sentimento) que se destacou, a par da resiliência, inquietude, expetativa, volatilidade, resiliência, otimismo ou adaptabilidade.
Questionados sobre as suas perspetivas para 2025, 87% dos presentes afirmaram que entram mais otimistas em 2025, e os restantes 13% acreditam que a sua atividade vai ser igualmente dinâmica. Ou seja, não têm expetativas de descida do mercado em 2025.
Há preocupações latentes, com a crise da habitação à cabeça, nomeadamente a necessidade de aumentar efetivamente a oferta acessível, mas também com o impacto das mudanças na fiscalidade (para residentes ou estrangeiros), com a eficiência e a execução do PRR, ou com o futuro do planeamento urbano e da criação de novas centralidades.
Mercado residencial começa o ano em alta
Seja como for, o facto é que, apesar de todas as instabilidades e receios sentidos em 2024, o mercado português teve um comportamento até “estonteante”. Quem o diz é Ricardo Guimarães, diretor da Ci, que recorda que “os investidores quiseram esperar para ver” na primeira metade do ano. Em paralelo, algumas famílias ficaram fora do mercado, devido à subida das taxas de juro, o que levou a uma descida acentuada do número de transações que, no entanto, só abrandou o ritmo de valorização dos preços, para 7%. Mas, assim que os juros pararam de subir, o mercado voltou a animar.
Ricardo Guimarães identifica que esta curva de crescimento de procura e de valorização do mercado residencial se mantém no início de 2025. E calcula que a tendência deste ano seja inversa à do ano passado, ou seja, “o segundo semestre será de maior estabilização, com uma valorização em torno dos 2%”. Ao mesmo tempo, continua a haver um gap “grande e crescente” entre as intenções de investimento dos promotores imobiliários e a obra efetivamente licenciada. “Isto quer dizer que a oferta não está a acompanhar, e há cerca de 60.000 fogos prontos a arrancar”, estima.
Ricardo Sousa, CEO da Century 21 Portugal, atesta este otimismo, e refere que “os nossos agentes esperam que o seu negócio seja melhor em 2025”, apesar de esperarem uma descida no número de negócios. No que toca aos preços, “a maior parte acredita que possam subir e os restantes esperam que se mantenham estáveis”, ou seja, não há expetativa de descida dos preços. Os portugueses “estão a mover-se no território” à procura de imóveis que correspondam ao seu budget, cada vez mais longe dos centros urbanos.
Patrícia Barão, vice-presidente da APEMIP, confirma que o ritmo de vendas em planta se mantém dinâmico, especialmente na altura dos lançamentos. “Continuamos a ter muitas manifestações de interesse, e há muitos portugueses a investir, entrando numa primeira fase com a expetativa de vender posteriormente. A compra em planta continua a ser uma boa opção para quem tem algumas poupanças disponíveis”. Além disso, a banca exige uma certa percentagem de pré-vendas (consoante a instituição) para financiar os projetos de promoção imobiliária.
Custos de construção vão continuar em alta
Com maiores ou menores variações, parece certo que os custos de construção da habitação vão continuar altos, sem previsão de qualquer descida. Ainda que os materiais já tenham estabilizado, é o preço da mão-de-obra que continua a subir significativamente.
José Rui Meneses e Castro, Co-CEO do MAP Group, não duvida que “os custos de construção vão subir, por um lado, e descer, por outro”. Explica: “vamos ter de construir habitação de luxo, com outras características, porque o cliente vai pedir isso. Por outro lado, os custos terão necessariamente de diminuir num segmento mais baixo. E vamos ter de nos adaptar, nomeadamente com novas formas construtivas, mais eficientes”.
O setor espera desafios nos próximos anos. Há oferta acessível para criar, um Plano de Recuperação e Resiliência para cumprir e muitos edifícios a renovar, que terão de ser muito mais eficientes para cumprir com a nova diretiva europeia. Os especialistas apontam a necessidade de atrair a mão-de-obra portuguesa que emigrou na última crise financeira, e de acelerar a construção industrializada e modular.
Bom 2024 anima perspetivas para o investimento em 2025
Também há boas perspetivas para o investimento. Os números da Iberian Property apontam que o volume total de investimento em imobiliário comercial em Portugal no ano passado tenha rondado os 2.300 milhões de euros, um aumento de 36% face ao ano anterior. O setor do retalho foi predominante, e representou quase metade deste volume. E a quota ibérica de Portugal está a aumentar, tendo subido dos 14% de 2023 para entre 16% e 17% em 2024, em linha com os últimos cinco anos, e deverá continuar a aumentar este ano. Francisco Horta e Costa, diretor da CBRE Portugal, confirma o sentimento de mercado positivo, e refere que “estamos no spotlight dos investidores”. Com o abrandamento e descida das taxas de juro, os investidores também deverão ficar mais ativos, principalmente aqueles que dependem mais de financiamento.
Esperar para ver (e sentir) a política americana
Ficou claro neste encontro que os profissionais têm ainda dúvidas sobre a forma como a política externa vai influenciar o mercado português este ano. A tomada de posse de Donald Trump nos EUA parece ter trazido uma retoma dos mercados transacionais, mas há muita incerteza no ar, nomeadamente relativamente às políticas comerciais anunciadas e como podem afetar a Europa.
Abrindo este encontro, o professor e economista, João Duque, explicou que o mercado está atento à descida das taxas de juro, mas esta não será tão rápida ou tão forte como se poderia pensar inicialmente. “O fator mais importante será a maneira como a política económica e monetária dos EUA vai condicionar a evolução dos preços no mercado interno americano. A relação de paridade euro-dólar também depende disso. Se eu fosse um banco central, esperaria um pouco”. Seja como for, “as taxas de juro continuarão a descer, ainda que isso possa ser mais diferido no tempo e de forma menos agressiva do que seria expectável há um ano atrás. Isso terá impacto na atividade imobiliária a determinada altura”.
Dando algum contexto sobre a economia portuguesa, avança que o crescimento do PIB deverá rondar os 2%, acima dos 1,5% da União Europeia, o que “é um pouco desanimador em comparação com o que está previsto para o mundo, para os EUA ou para a China”.