Agora, volvidas cinco décadas, importa perguntar: está esse direito a ser verdadeiramente garantido? Infelizmente, a resposta é não. Portugal, como é sabido, enfrenta hoje uma das suas mais graves crises habitacionais. O acesso à habitação tornou-se um problema estrutural, transversal a várias faixas da população: dos mais jovens às famílias da classe média, dos trabalhadores independentes aos pensionistas. O que deveria ser um direito garantido tem-se tornado, na prática, quase como um direito em vias de extinção e de difícil acesso.
Tenho vindo a alertar: a realidade não pode ser ignorada. A oferta de habitação, sobretudo a preços acessíveis, é claramente insuficiente face à procura. As famílias sentem-se excluídas dos centros urbanos, forçadas a viver cada vez mais longe dos seus locais de trabalho e a suportar crescentes custos de mobilidade e perda de qualidade de vida. Já os jovens, mesmo com formação e emprego, veem-se sem condições para sair da casa dos pais ou para iniciar um projeto de vida autónomo.
É este o cenário preocupante que se vive em Portugal, bem sabemos, mas é também neste contexto, que tenho vindo, insistentemente, a alertar para a necessidade de mudar de paradigma. Não há forma de resolver a crise da habitação sem um aumento significativo da oferta. E para isso é imprescindível envolver todos os agentes do setor, incluindo o investimento privado, de forma construtiva, colaborativa e com visão de longo prazo.
Não se pode continuar a alimentar uma falsa dicotomia entre Estado e mercado, entre público e privado. A habitação acessível não se constrói com retórica, constrói-se com investimento, com planeamento, com estabilidade legislativa e com confiança. Os promotores e investidores estão disponíveis para contribuir com soluções concretas, sustentáveis e socialmente responsáveis. Mas para isso precisam de um enquadramento legal e fiscal previsível, de menos burocracia e de um discurso político que reconheça o seu papel positivo no ecossistema habitacional.
É fundamental repensar os modelos de urbanismo, descomplicar licenciamentos, incentivar o arrendamento de longa duração, mobilizar património público para projetos habitacionais e, sobretudo, promover parcerias público-privadas eficazes. Precisamos de políticas consistentes e continuadas, que não mudem a cada ciclo político, mas que resultem de uma estratégia nacional com objetivos claros e mensuráveis.
O 50.º aniversário da Constituição deve ser um ponto de viragem. Não basta reafirmar direitos no papel — é urgente cumpri-los na prática. O direito à habitação condigna é um dos pilares da construção de uma sociedade e da dignidade humana. Não o garantir é falhar com as próximas gerações e com os princípios fundadores da nossa democracia.
Os promotores e investidores imobiliários querem e podem ser parte da solução. Com sentido de missão, com propostas, com responsabilidade. Porque acreditamos que todos devem ter direito a viver com dignidade. E porque acreditamos que o investimento privado, quando bem enquadrado, pode e deve ser uma força transformadora para tornar esse direito uma realidade.
O que falta para podermos avançar com a construção das bases deste que é um dos direitos fundamentais?