A falta de mão-de-obra qualificada e a escassez de recursos construtivos refletem-se, sim, na edificação de novas casas; mas também se refletem, e cada vez mais, na impossibilidade de cuidar das que já temos, o que, logicamente, deve preocupar-nos a todos.
Neste contexto, é urgente agir. É urgente recrutar. É urgente preparar. É urgente formar. É urgente dignificar profissões absolutamente essenciais para a qualidade de vida de todos nós. Hoje, encontrar um canalizador, um eletricista, um pedreiro ou um pintor tornou-se, para muitos portugueses, um exercício de frustração. É urgente, também, que se compreenda que esta escassez de mão-de-obra é mais do que um constrangimento económico, acaba por ser um constrangimento de dignidade humana.
É dramático, por exemplo, o cenário que enfrentam milhares de idosos que vivem em casas degradadas, onde um cano que rebentou ou uma avaria elétrica podem pôr em causa a segurança, a higiene e a habitabilidade mínima. E nas condições descritas, não conseguem encontrar quem resolva esses problemas. Não conseguem porque não há. O problema, antes localizado, tornou-se estrutural. Tornou-se transversal. Tornou-se visível. E tornou-se caro.
Num contexto de escassez, as poucas soluções existentes fazem-se pagar a preços frequentemente descontextualizados da realidade de quem precisa.
Estes constrangimentos são sentidos de forma transversal: se para uma grande empresa já é difícil encontrar quem execute uma reparação urgente, imagine-se o que será para uma família sem contactos, sem estrutura, sem capacidade de negociação. A precariedade da resposta técnica ameaça tornar-se um traço definidor da nossa realidade habitacional.
Num país em que o parque habitacional é profundamente envelhecido, esta é uma questão que se tornará ainda mais aguda. Com o passar do tempo, todas as casas precisarão de ser reparadas. Todas, sem exceção. E se nada for feito, não haverá quem o faça.
Um inquérito realizado pela AICCOPN revela-nos dados que falam por si: 86% das empresas de obras privadas e 75% das empresas de obras públicas identificam a escassez de trabalhadores qualificados como o principal entrave à sua atividade. Paralelamente, o preço das matérias-primas é já um fator crítico para 39% das empresas. Trata-se, portanto, de um triângulo de pressões: escassez de mão-de-obra, custo dos materiais e desequilíbrio nos preços contratados, que ameaça colapsar o sistema.
Logicamente, não podemos continuar a adiar respostas. É preciso agir estruturalmente, é preciso melhorar a eficiência energética das habitações envelhecidas, é preciso reparar o que está estragado, é preciso pensar estrategicamente e investir. As atividades de construção, reparam, protegem e asseguram continuidade dos espaços onde vivemos.
É tempo de encarar esta realidade com a seriedade exigida. É tempo de devolver prestígio às profissões ligadas à construção, de as tornar apelativas, de investir na sua formação e valorização. E é tempo, também, de perceber que quando falta quem edifica, falta quem cuida das nossas casas e, consequentemente, das nossas pessoas.