Manuel Reis Campos
Manuel Reis Campos
Presidente da CPCI e da AICCOPN

Porque é que as Obras Públicas têm de pagar 1% para a Cultura?

21/07/2021

Porém, tal como está atualmente formulada, regra geral, esta proposta legislativa conduz a um aumento de 1% no custo de todas as obras de valor superior a 5 milhões de euros, por fatores que não advêm do processo de construção, ou seja, estamos perante uma espécie de novo imposto cultural sobre a execução de infraestruturas, com o ónus público do agravamento dos preços da construção a recair sobre os empreiteiros. O dono de obra escolherá o artista e a respetiva obra de arte, mas a empresa de construção terá de contratualizar e assegurar a execução e a entrega da obra de arte tal como pretendida pelo dono da obra pública, pelo que, os efeitos deste regime são claramente desfavoráveis para a imagem do setor e das suas empresas e, nesse sentido, merecem a nossa total rejeição.

Estamos, portanto, a executar uma política pública, neste caso uma política cultural, mas através de canais errados, envolvendo as empresas de construção num processo que não tem nenhuma relação direta ou indireta com os custos de construção da obra ou com a sua gestão, não beneficiando os melhores princípios de gestão dos investimentos públicos em infraestruturas. E, não questionando a legitimidade do Governo para tomar decisões em matéria de política de obras de arte de fruição pública, compete-nos alertar para o facto de que será introduzido um custo automático e adicional de 1% nas empreitadas de valor superior a 5 milhões de euros, num contexto em que o País e o mundo se debatem com pressões inflacionistas e com significativos aumentos de preços das matérias-primas e, em particular, dos materiais de construção. Estimamos que, no âmbito do PRR, esta política possa vir a representar redução do investimento previsto de 260 milhões para satisfazer os encargos com a fruição da arte e que será orientada, apenas, para os novos investimentos, já que não abrange infraestruturas ou equipamentos já existentes.

Esta proposta de projeto-lei tem na sua base uma política de promoção e integração de obras de arte que não nos compete discutir e que até consideramos meritória e capaz de contribuir para a imprescindível valorização do território nacional, mas não pode ser concretizada à custa de um Setor específico e muito menos no atual contexto económico e social.

A competitividade das empresas portuguesas face à concorrência externa, a definição de um planeamento e a calendarização dos investimentos previstos no PRR, são prioridades absolutas para assegurar a efetiva retoma da economia e do emprego. A introdução deste regime, tal como está a ser proposto, põe em causa, desde logo, a clareza, o rigor e a transparência nas escolhas e avaliação dos investimentos públicos, e agrava a posição das empresas do Setor, principalmente na atual conjuntura.