Paulo Caiado
Paulo Caiado
Presidente da Direção Nacional da APEMIP

Recrutados à força

11/06/2025

É importante notar que o congelamento das rendas ao longo de tantos anos tem gerado uma situação de desajuste e de desequilíbrio. Embora o arrendamento a preços praticamente congelados possa, em princípio, beneficiar o inquilino, a realidade é bem diferente quando se considera o desgaste do imóvel e a falta de incentivos e recursos para a sua manutenção.

O proprietário, que inicialmente viu a sua casa como uma fonte de rendimento, vê-se agora preso a um valor desajustado e totalmente incompatível com a evolução do mercado. Para agravar ainda mais a situação, muitos destes imóveis, que na sua maioria se encontram em zonas centrais das grandes cidades, estão a deteriorar-se devido à previsível falta de investimento e de renovação.

Por outro lado, os inquilinos, que poderiam usufruir de um preço de arrendamento abaixo da média do mercado, muitas vezes enfrentam dificuldades em realizar os trabalhos de manutenção essenciais.

Casas com mais de 30 ou 40 anos necessitam de intervenções periódicas e substanciais para garantir a sua habitabilidade. No entanto, muitos inquilinos não possuem os recursos financeiros nem a motivação necessária para realizar essas obras, criando uma situação de estagnação onde o imóvel, a renda e a qualidade de vida permanecem congelados, enquanto a sociedade continua a sofrer com as consequências de uma política de arrendamento obsoleta.

O conceito de "parceiros não remunerados" para o Estado português é um conceito que traz consigo um peso considerável. Estes proprietários não recebem a justa compensação pelo seu imóvel, mas, em contrapartida, são forçados a manter acordos de arrendamento que beneficiam um mercado com preços praticamente imutáveis, independentemente da situação financeira do inquilino. Como resultado, esses proprietários tornam-se de facto prestadores de um serviço público involuntário, prestando apoio a um modelo de habitação que não reflete as necessidades do século XXI.

O Estado português, com uma taxa de habitação pública que não ultrapassa os 2%, e uma taxa efetiva de 4%, incluindo os 120 mil proprietários que mantêm arrendamentos congelados, deve refletir sobre a sua responsabilidade nesta questão. Ao olhar para o mercado habitacional, o

Estado deve ser capaz de analisar de forma criteriosa a condição financeira dos inquilinos, para que, efetivamente, sejam os mais carenciados a beneficiar desta política.

Não faz sentido que, em pleno século XXI, um governo continue a permitir que arrendamentos mantidos por décadas em condições desajustadas sirvam apenas para garantir uma política de apoio que não reflete as reais necessidades da população.

A questão que se coloca, e que exige uma resposta urgente, é a de saber até que ponto o Estado português está disposto a aceitar que os inquilinos com uma boa condição financeira continuem a usufruir de rendas praticamente congeladas, enquanto os proprietários se veem forçados a manter as suas casas em condições precárias, sem que exista um mínimo de atualização nas rendas. O momento para alterar este paradigma parece ter chegado.

Ademais, a solução para este impasse passa pela revisão das rendas e pela atualização das condições do arrendamento. É necessário que o Estado português, com base numa análise detalhada da realidade financeira dos inquilinos, comece a aplicar medidas que permitam equilibrar as condições de arrendamento. A lógica por trás de uma verdadeira política habitacional deve ser a de garantir que todos, quer inquilinos quer proprietários, sejam tratados de forma justa e equitativa.

A questão das rendas antigas não deve ser vista como um fardo, mas como uma oportunidade para criar um modelo de arrendamento mais justo, mais dinâmico e mais eficaz. O futuro da habitação em Portugal exige uma abordagem mais responsável, mais eficiente e mais consciente das realidades socioeconómicas do país.