O imobiliário contribui hoje com quase 40% das emissões e consome perto de 35% da energia. Tem, obrigatoriamente, de fazer parte da transição “verde” da economia, e o financiamento é visto como uma peça chave neste esforço conjunto e global. Até porque a sustentabilidade é hoje uma obrigação e não um nice to have. Existem novas metas de descarbonização a nível europeu e nacional, e o financiamento vai ajudar a dar esse salto, privilegiando e diferenciando os projetos considerados ambientalmente sustentáveis, ou “verdes”.
Os edifícios vão ser cada vez mais uma peça-chave das estratégias de sustentabilidade das empresas, acredita Ângela Monteiro, diretora de Finanças Sustentáveis do Millennium bcp. Falando num Almoço-Conferência da revista Vida Imobiliária dedicado ao tema, garantiu que as empresas estão cada vez mais comprometidas com os critérios ESG (Environment, Social, Governance), e que “o que antes era opcional, e sobretudo uma matéria de consciência, hoje é cada vez mais matéria obrigatória, porque há requisitos regulatórios e legislativos”, e pode acarretar “risco de reputação”. Isto é especialmente verdade no que toca ao investimento imobiliário, com os investidores e promotores imobiliários cada vez mais preocupados com as questões ambientais, procurando não só seguir as melhores práticas, como também garantir nos seus projetos mais certificações de sustentabilidade, como os selos LEED ou BREEAM, que vão valorizar os imóveis a longo prazo. Mas também os ocupantes, nomeadamente de escritórios, exigem este novo patamar de sustentabilidade.
“Só com o setor financeiro "a bordo" e motivado vamos conseguir atingir os objetivos”
Para Nelson Lage, presidente da ADENE-Agência para a Energia, com o parque edificado português a precisar de várias melhorias, a disponibilidade e diversificação de financiamento é essencial para cobrir as despesas associadas às obras necessárias. Por isso mesmo, “o setor financeiro desempenha um papel chave na transição global para uma economia descarbonizada”. Considera que a banca tem “interesse em ser agente ativo na promoção da sustentabilidade e na aplicação prática de critérios ESG aos negócios e atividades que financiam, como o imobiliário”.
O responsável da ADENE recorda que a UE e as entidades reguladoras “têm implementado várias estratégias e obrigações que estimulam à ação climática das instituições de crédito”, nomeadamente a divulgação do rácio de ativos verdes (GAR). “No setor imobiliário, isso tem como principal métrica a classificação energética dos edifícios, com os bancos a privilegiar o financiamento a edifícios com melhor classe energética”. Esta diferenciação entre os ativos mais e menos “verdes” deverá “cada vez mais estimular as instituições financeiras a optar por edifícios de elevada eficiência. Existe, por isso, a expetativa que este alinhamento de interesses entre financiamento bancário e o objetivo da ELPRE – Estratégia de Longo Prazo para a Renovação de Edifícios conduza a uma progressiva aceleração das obras de renovação e melhoria do desempenho energético do edificado nacional. “Temos de ter capacidade de ver mais além, porque serão as gerações futuras a lidar com as consequências das decisões que tomamos hoje (…). Só com o setor financeiro ‘a bordo’ da transição e motivado vamos conseguir atingir os objetivos pretendidos”, completa ainda Nelson Lage.
“Ouviremos cada vez mais falar de Taxonomia”
Uma das principais novidades neste âmbito é a Taxonomia da União Europeia, que estabelece uma classificação de atividades económicas, de acordo com o seu impacto climático e ambiental, com o intuito de fomentar o crescimento económico sustentável. Ângela Monteiro explica que, no fundo, “é o que vai determinar critérios uniformes para que as várias entidades estejam sujeitas aos mesmos critérios, nomeadamente no imobiliário, ao nível da construção, da promoção de novos edifícios ou renovações”, com o objetivo de “termos um edificado mais verde, com benefícios para todos nós”, e de forma justa. Ângela Monteiro está convicta de que “ouviremos cada vez mais falar de Taxonomia. Os bancos terão um papel muito importante ao canalizar capital para este segmento dos edifícios que cumprem com os critérios da Taxonomia europeia”, e na promoção do financiamento “verde”, favorecendo novas soluções de sustainable finance, entidades alinhadas com os esforços de descarbonização, ou que estiverem em fases de transição. Estes compromissos serão “cada vez mais relevantes no acesso ao financiamento”, explica, “os bancos estão sujeitos a regulação específica nestes temas e eles próprios assumem compromissos de neutralidade carbónica e exigem integração do ESG nas decisões e condições de financiamento”.
Soluções de financiamento “verde” já são uma realidade
A promoção imobiliária conta hoje com soluções para projetos focados na sustentabilidade. É o caso do “Crédito à Promoção Imobiliária Verde” do Millennium bcp, que se traduz na concessão de condições mais vantajosas no financiamento de projetos de construção ou de reabilitação urbana com certificação de sustentabilidade BREEAM (Building Research Establishment Environmental Assessment Method) nas classificações Very Good a Outstanding ou LEED (Leadership in Energy and Environmental Design) nas classificações Gold ou Platinum, promovendo desta forma a transição progressiva para um imobiliário “sustentável” e ecologicamente responsável.
Quando falamos de sustentabilidade imobiliária, estamos a considerar um conjunto alargado de critérios e desafios que são avaliados pelas certificações de sustentabilidade que requeremos: de eficiência energética (recorrendo a sistemas e tecnologia que permita minimizar os consumos de água e energia), de otimização térmica, de escolha de materiais de menor impacto ambiental, da adoção de práticas que minimizem a geração de resíduos e desperdício na construção, na durabilidade dos materiais, na integração harmonizada de áreas verdes e espaços abertos, na proximidade a sistemas de transporte público, nas condições de incentivo ao uso de meios de transporte sustentáveis, entre outros aspetos igualmente relevantes.
Os projetos imobiliários verdes evoluíram de uma tendência para uma condição, obrigando a uma avaliação cuidada e consciente de impacto ambiental e à preocupação com a qualidade de vida dos seus ocupantes. Porém, uma obrigação com benefícios evidentes, na medida em que, para além da resposta que urge assegurar à absoluta prioridade da sustentabilidade, contribui para a valorização e atratividade dos imóveis a longo prazo.