Habitação deve ser mais acessível e sustentável, mas preços vão continuar a subir

19/07/2023
Habitação deve ser mais acessível e sustentável, mas preços vão continuar a subir
A Convenção APEMIP | IMOCIONATE decorreu a 4 de julho no CCB

Com o atual contexto económico, é ainda mais desafiante construir habitação acessível que seja sustentável. Mas tem de ser este o caminho, e a câmara de Lisboa garante que é possível, e que está a responder “com o pé no acelerador”.

É o que afirma a vereadora da Habitação da Câmara Municipal de Lisboa, Filipa Roseta, participando na 1ª Convenção APEMIP | IMOCIONATE, que decorreu a 4 de julho no CCB, em Lisboa, para debater os principais desafios e o futuro do mercado imobiliário. Para a autarca, conciliar a acessibilidade da habitação com a sustentabilidade não é fácil, mas é um desafio assumido pela autarquia: “a nossa Carta Municipal de Habitação vai levar estes desafios ao limite, porque queremos habitação acessível com grande eficiência energética. Construir mais habitação, só faz sentido nesta linha”.

E Filipa Roseta garantiu que “é possível, sim, pois temos um orçamento camarário de mais de 200 milhões de euros, que compara com os 14 milhões de há 10 anos. A habitação é a nossa primeira prioridade, e tem de ser necessariamente conjugada com a eficiência energética, é um e o mesmo desafio”. Recordou neste evento que a autarquia já assinou com o IHRU um contrato de financiamento de 800 milhões de euros, dos quais 500 milhões de euros provêm do PRR e cerca de 300 milhões de euros do orçamento municipal. 

O desafio é idêntico na Madeira. Pedro Calado, presidente da Câmara Municipal do Funchal, foi também convidado neste evento, testemunhando que também nesta região se sente a pressão dos preços na habitação. “Temos de adaptar o nosso parque habitacional a uma nova necessidade energética, e só este ano investimos cerca de 2 milhões de euros na remodelação total de dois bairros”. Considera que “pior que a falta de oferta de habitação são os rendimentos baixos das famílias. A habitação disparou muito acima da capacidade das famílias”.

O que é certo é que “não podemos adiar mais o caminho da sustentabilidade”, acredita o investigador Manuel Collares Pereira, e “temos de olhar para o setor do imobiliário de uma forma séria, porque 41% das emissões de CO2 vêm dos edifícios”. Está certo de que “existem hoje muitas soluções técnicas para isto, sobretudo para o comportamento energético dos edifícios”, e dá o exemplo da sua empresa, a Vanguard Properties, que “não vai investir de forma que não seja sustentável”.

Admitindo a necessidade absoluta de ter uma economia mais sustentável, Roberto Colomer, diretor geral da UCI Portugal e presidente da EMF, é cético quanto às metas europeias: “os desafios de aplicabilidade são enormes”, assim como “a enorme quantidade de dinheiro necessária para atingir estes objetivos. Tenho muitas dúvidas de que seja fácil atingir este objetivo. Terá de ser através de um trabalho conjunto entre o setor público e o privado”.

Contexto incerto ainda não trava valorização do imobiliário

Apesar do atual contexto de taxas de juro em alta, e depois de recordes de valorização em 2022 e com um crescimento homólogo dos preços de 14% até maio, o mercado da habitação português continua a mostrar-se resiliente, e as expetativas dos especialistas são de manutenção da valorização, ainda que a um ritmo menos intenso.

Ricardo Guimarães, diretor da Confidencial Imobiliário, lembrou que existe hoje “muito pouco volume de oferta e grande nível de procura, a par de baixos rendimentos das famílias portuguesas”, que tem resultado numa “grande taxa de valorização da habitação, porque o mercado deixou de ser só Lisboa, e passou a ser mais diversificado”, com as maiores subidas a registarem-se nas cidades médias do país.

O número de vendas de habitação vinha abrandando nos últimos meses, mas a verdade é que voltou a subir nos últimos três meses, “um espelho de uma alteração do sentimento de mercado”, já que “o principal fator impulsionador do investimento é a expetativa de não desvalorizar, e hoje temos o consenso de que o imobiliário não vai desvalorizar. Era um receio que existia”, nomeadamente durante a pandemia, mas que não se comprovou.

Não há como negar o contexto económico desafiante dos tempos que correm. Participando numa das mesas redondas de debate deste dia de conferência, e dando a sua perspetiva para a economia portuguesa nos próximos meses, o professor e economista João Duque destacou a “grande alteração do enquadramento” devido à subida das taxas de juro para controlar a inflação, o que faz antever um abrandamento das economias a nível europeu, mas Portugal deverá continuar com uma boa performance, muito graças aos recordes que o setor do turismo continua a bater. Assim, a nossa economia deverá crescer cerca de 2,5% até ao final do ano. E, segundo prevê, “pode haver efetivamente uma redução pelo menos das taxas de valorização do património, o que não significa desvalorização”.

Ainda assim, as taxas de juro entraram num ciclo positivo e não deverão baixar em breve, muito menos voltar ao período negativo do último ano. Para António Ramalho, gestor e consultor internacional, esta subida “era inevitável”, apesar de ter sido anormalmente rápida. E o facto de a inflação já estar a ser controlada “não quer dizer que as taxas de juro desçam, acho que vão manter-se nestes níveis durante um longo período de tempo. Podemos contar com taxas de juro de curto prazo no mínimo de 2,5%”. Apesar do contexto, António Ramalho mostra-se confiante no setor imobiliário, que considera “extraordinariamente bem sucedido em Portugal”, sem prever qualquer crise de crédito à habitação. “Se não aconteceu durante a troika, seguramente não vai acontecer agora”.

Marina Gonçalves reitera “trabalho de parceria” com o setor imobiliário

A ministra da Habitação, Marina Gonçalves, esteve também presente nesta convenção, e não deixou de salientar a importância do “trabalho de parceria” entre o Governo e o setor para melhorar a situação da habitação no país. A sua presença foi “mais um passo neste trabalho de parceria e de comunidade que temos de fazer em prol de um setor tão importante como o do imobiliário e da habitação”. Deixou “uma mensagem de reforço da importância deste trabalho de diálogo e parceria para promovermos política pública, porque o setor que representam é fundamental para estas políticas de habitação, e contamos também convosco neste trabalho. Não estamos, de todo, em polos opostos, trabalhamos para o mesmo, e devemos focar-nos nas parcerias e naquilo que podemos desenvolver em conjunto. Queremos continuar a discutir com o setor e a estar presentes, num diálogo aberto e franco”, conclui a ministra.