Investidores pedem mais previsibilidade para construir para arrendamento

25/09/2024
Investidores pedem mais previsibilidade para construir para arrendamento
Pedro Baganha, vereador do Urbanismo da Câmara Municipal do Porto, e Filipa Roseta, vereadora da Habitação da Câmara Municipal de Lisboa, no evento

Terminou esta terça-feira a 8ª edição do Portugal Real Estate Summit, um evento organizado pela Iberian Property, dedicado ao investimento imobiliário, que reuniu cerca de 500 profissionais e investidores imobiliários em dois dias de conferência no Hotel Palácio Estoril. A habitação, a tecnologia ou as melhores oportunidades de investimento do país estiveram em destaque. 

A habitação acessível foi um dos principais temas em destaque no evento, em particular o segmento Build to Rent, ou construção para arrendamento, que ainda não existe em Portugal, mas cujo contributo é considerado essencial para equilibrar a oferta de habitação do país. 

Fazendo um breve contexto deste mercado em Portugal, os especialistas da Savills e da JLL destacaram que Portugal tem todos os fundamentais para investir em produtos residenciais Build to Rent, que já existe noutros países europeus, nomeadamente escassez de oferta e taxas de esforço muito elevadas.

Gemma Kendall, da JLL, recorda que “temos perguntado aos investidores por que razão não investem em Build to Rent em Portugal, e respondem-nos que é por causa da liquidez”. Por outro lado, a manutenção das rendas e da taxa de esforço em alta faz com que a maior parte dos potenciais inquilinos sejam expatriados, “e os investidores não querem depender só desse mercado. Precisamos de garantir que o mercado local existe”. Seja como for, uma das principais razões para o atraso do investimento neste setor continua a ser o facto de a construção para venda garantir retornos superiores aos da construção para arrendamento. “Isto é verdade não só em Portugal, mas também noutros mercados”, diz a especialista.

Muitos investidores presentes no evento deixaram também claro que a previsibilidade da regulamentação, nomeadamente dos tempos de licenciamento, é uma das principais necessidades para investir neste setor. Durante a conferência, os participantes puderam responder a um breve inquérito sobre o tema através do Wooclap. Questionados sobre o que é necessário para que o Build to Rent seja atrativo para investir em Portugal, 40% da plateia respondente indicou a estabilidade legislativa, e 35% benefícios fiscais. 9% indicaram o financiamento e 6% a infraestrutura urbana. 

Sobre qual o fator mais importante para os inquilinos na hora de escolher um imóvel para arrendamento (BTR), 65% indicaram a localização e a acessibilidade, seguida pelos 27% das opções de contrato flexíveis. A gestão e manutenção profissional foi indicada por 7%. 

Paula Sequeira, da Savills, apontou que “o Governo tem ainda muito que fazer ao nível legislativo, nomeadamente questões como o IVA reduzido” na construção. Para que os projetos aconteçam, “temos de mitigar os fatores que os investidores e promotores imobiliários encaram como riscos”. 

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Lisboa e Porto chamam privados a construir habitação para arrendamento acessível

Os municípios querem ser parceiros dos investidores privados na criação de mais habitação acessível, e estão a desenvolver novos modelos para atrair esse investimento. Lisboa assume o aumento da oferta de habitação como “a nossa máxima prioridade”, avançou a vereadora da Habitação da Câmara Municipal de Lisboa, Filipa Roseta. “Lisboa tem espaço para crescer, queremos construir 3.000 habitações públicas e temos outras 4.000 para desenvolver com privados”, nomeadamente através do novo modelo de concessão de terrenos, para construção de habitação acessível. 

Este modelo concede terrenos por 90 anos, com projeto aprovado, pronto a construir, com área pré-definida para projetos sociais ou rendas em mercado livre. A promessa é de retornos de longo prazo com as rendas. E Filipa Roseta apelou: “olhem para a Noruega, Suécia, e outros países nórdicos, onde isto funciona. Começaram com menos de 100 unidades, e hoje têm mais de 100.000. Podemos fazer isso aqui também?”. 

Pedro Baganha, vereador do Urbanismo da Câmara Municipal do Porto, reconheceu o “problema de acessibilidade na habitação, principalmente da classe média. Sabemos que a única solução estrutural é aumentar a oferta, e queremos passar a oferta pública de 2% para 10% nos próximos 6 anos. Mas sabemos que isso não é suficiente”, por isso o município está também a promover modelos de parcerias público-privadas para construção de habitação acessível. “Estamos a trabalhar em 7 projetos importantes”, em zonas como Campanhã ou Contumil, e o município tem um modelo de Build to Rent ativo, baseado em arrendamento e subarrendamento. 

“Hoje temos um sentimento mais otimista” no investimento

Ricardo Reis, da Deloitte, traçou nesta conferência um retrato do sentimento global dos investidores imobiliários, com base num inquérito recente da consultora, mostrando que os acontecimentos dos últimos anos, como o fim da pandemia, o início da guerra na Ucrânia ou a inflação, levaram a que os investidores “arriscassem menos”, mas “estamos agora num ponto de viragem” nessa abordagem. Isto porque há a perceção de que se está a controlar a inflação, e uma expetativa da descida das taxas de juro, mas a cautela deverá manter-se. 

“Hoje temos um sentimento mais otimista. Devemos assistir a um aumento do volume de transações, mas também dos retornos”. Considera que os investidores “não estão a sair do imobiliário, e vão continuar a investir em Portugal, mas o refinanciamento é um ponto de pressão que se mantém”. O turismo é um dos segmentos que mais investimento está a atrair, assim como os segmentos alternativos residenciais, como residências sénior ou de estudantes. E recorda que o problema da habitação se deverá manter, não sendo só português, mas também europeu e global. 

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Economia portuguesa “está bem, mas não é motivo de celebração”

Carlos Costa, antigo governador do Banco de Portugal, foi um dos oradores convidados do Portugal Real Estate Summit, para partilhar a sua visão sobre o estado atual da economia portuguesa, e apontou que “a economia portuguesa fez um bom trabalho de recuperação nos últimos anos. Estamos bem, mas não é motivo para celebrar. Uma situação de saúde é sempre transitória”. Neste momento, é necessário crescer e recuperar, “temos de subir com grande esforço”, nomeadamente “aumentando a produtividade”, com mais educação e formação, sem deixar os talentos sair do país, nomeadamente os jovens: “o problema não são os jovens que saem, mas sim o país que não está a criar oportunidades” para que fiquem. “Precisamos de um ambiente que premeie os esforços e que o investimento seja prioridade, um mercado onde todo o investimento é otimizado”. E não deixou de realçar que o setor imobiliário “é um dos pilares da economia. O capital social depende de pilares como as infraestruturas ou a habitação”, exemplificou. 

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