Mais reabilitação urbana é necessária para criar mais habitação

08/05/2024
Mais reabilitação urbana é necessária para criar mais habitação
Esta sessão realizou-se a 2 de maio, no Salão Imobiliário de Portugal

Continuar a apostar na reabilitação urbana é uma das vias para aumentar a oferta de habitação, e também para preservar o património das cidades. Um investimento que, hoje em dia, depende muito do capital estrangeiro e do turismo, e também dos incentivos e investimento público, e que tem externalidades positivas e negativas. 

A reabilitação urbana foi o tema central de um dos painéis do ciclo de conferências CNN Portugal Summit, que se realizou a 2 de maio, no SIL. 

António Gil Machado, diretor da Vida Imobiliária, constatou durante o debate a quebra que se tem registado nesta atividade, e que “a reabilitação urbana é um terço daquilo que era em 2018”. Nesse ano, “foram lançados 2.400 fogos para reabilitação urbana em Lisboa, ao passo que em 2022 e 2023 esse número rondou os 800. Já no Porto, o investimento foi de 135 milhões de euros e, em 2023, de 44 milhões de euros”. Para esta redução drástica deverá ter contribuído o fim do Regime Especial para a Reabilitação Urbana, que facilitava os procedimentos. “Em 2019, a Autoridade Tributária que antes aceitava o IVA a 6%, passou a exigir das câmaras um documento a reconfirmar que as autarquias estavam de acordo em baixar o IVA dos 23% para os 6%, portanto muita obra em Área de Reabilitação Urbana deixou de ser a 6% de forma automática; depois houve o efeito da pandemia e alguma restrição ao alojamento local”, recordando que “entre 2014 e 2018, o turismo foi o grande motor da reabilitação urbana”.

Nos anos mais recentes, cerca de 71% das compras de habitação são feitas por estrangeiros, 40% em valor, segundo os dados da Confidencial Imobiliário. Dando este contexto, não deixou de realçar um cenário em que “temos um copo meio cheio ou meio vazio: os centros são muito atrativos para o investimento internacional, podemos ver isso como uma vantagem ou desvantagem”, acrescentou ainda.

Cooperativas de habitação são uma das soluções propostas pela Câmara de Lisboa 

Presente também na conferência, Filipa Roseta, vereadora da Habitação da Câmara Municipal de Lisboa, destacou a importância de apostar na reabilitação urbana. “A Câmara de Lisboa tem muita propriedade vazia e muitos lotes por reabilitar. Estamos a fazer um esforço descomunal para que o património da câmara não esteja a contribuir para a degradação da cidade. Estamos a aproveitar o PRR para todo aquele que é o nosso património, mas estamos a desenhar programas para convidar parceiros a entrarem connosco neste esforço brutal que é a habitação”. A vereadora convidou todos os presentes no auditório “a ler a nossa Carta Municipal da Habitação online, onde temos um mapa muito detalhado de tudo”. No que aos instrumentos municipais diz respeito, Filipa Roseta destacou o programa de cooperativas, afirmando que “já temos 5 terrenos praticamente sem habitações e se funcionar a primeira vamos multiplicar por muitas”.

Maria Begonha, vice-presidente do Grupo Parlamentar do PS, ressaltou o “consenso” em relação à “importância de apostar no cooperativismo e na habitação privada sem fins lucrativos”. E nota que “a solução cooperativa faz parte de um eixo maior: como compatibilizamos o papel das cidades como centros de desenvolvimento turístico e inovação com a necessidade premente de garantir habitações a preços acessíveis”. 

Referindo-se às declarações do ministro das Infraestruturas e da Habitação, Miguel Pinto Luz, feitas alguns minutos antes noutra intervenção também no SIL, Maria Begonha remata que “passámos da intervenção de rasgar o Mais Habitação para uma ideia diferente de que ‘não vamos rasgar tudo’. Se olharmos para os eixos principais do Mais Habitação, vemos o lançamento de parcerias público-privadas, intervenção na simplificação de procedimentos, aposta em novas soluções habitacionais e de combate à especulação”.

Investimento público também pode contribuir para “um choque global da oferta"

Por outro lado, Nuno Piteira Lopes, Vice-Presidente da Câmara de Cascais, expressou a necessidade de um “choque global da oferta” no que diz respeito à habitação. “Ouve-se falar muito na habitação para os jovens e mais idosos, tudo isso é preciso, mas penso que deveríamos ir mais além: em Cascais estamos a procurar quais são as grandes faixas em que é preciso resolver o problema da habitação”. Neste sentido, “começámos pelo princípio: nos últimos dois anos adquirimos já cerca de 200 hectares, pois para construir casas é preciso terrenos”, referindo que “temos de passar dos 3% de habitação pública no concelho de Cascais para atingir os 10% ou 15%”. Neste momento, “temos cerca de 30 milhões de euros em concurso público para construção de nova habitação e 50 milhões de obra de reabilitação da habitação pública de 1ª geração”.

António Gil Machado concluiu que nos últimos 10 anos, Portugal “foi descoberto por todo o mundo, algo que não estávamos à espera. Neste sentido, temos de tomar uma decisão: queremos ser atrativos para o capital estrangeiro? A valorização dos nossos patrimónios é boa ou é má? Penso que é preciso resolver essa dúvida”. O capital internacional “está cá, só que isso causa externalidades negativas que têm de ser geridas e os municípios estão a fazer o esforço possível, que é fazer investimento público”. 

Filipa Roseta complementou, confirmando que “queremos investimento estrangeiro, mas a consequência [desse investimento] é uma pressão muito grande na habitação, principalmente nos centros históricos de Lisboa”. No âmbito da Carta Municipal de Habitação, “as nossas habitações nestas áreas têm de ser 75% para pessoas que vivem ou moram nesta zona da cidade”, adiantou.