Pandemia empurrou escritórios para momento “histórico”

02/11/2022
Pandemia empurrou escritórios para momento “histórico”

“ON/OFF: Wellbeing e eficiência nos modelos híbrido e remoto” deu mote à mais recente conferência das Jornadas 2022 da Associação Portuguesa de Facility Management, que se realizou a 26 de outubro, em Lisboa. Os especialistas reuniram-se para refletir sobre as novas tendências do trabalho corporativo, e para desenhar novas estratégias de futuro, na ótica do Facility Management. Ficou claro que nem todo o caminho está traçado, mas não há volta atrás.

Francisco Vazquez, diretor da 3g Office, recorda que o tema da transformação empresarial já era discutido muito antes da pandemia, mas este foi o evento que serviu de empurrão para as mudanças na forma de trabalhar. "A pandemia não foi o melhor piloto de teletrabalho, com filhos em casa e um vírus à porta, mas surtiu efeito. Todos tivemos de perder o medo da tecnologia.

Hoje, há ainda "muita inquietação nas empresas sobre como trabalhar ou quantos metros quadrados são necessários. Mas sabemos que o conceito de “novo normal” é certo, é um momento histórico. E não hesita que "os escritórios da nova era não podem ter regras da era anterior.

Com a pandemia, "experimentou-se a facilidade de fazer muitas tarefas de forma remota, e hoje muitas pessoas querem manter essas vantagens, sem voltar ao escritório nas condições anteriores. O especialista afirma que "agora, procuramos um modelo win-win, que ainda não encontrámos. Pode ser um modelo mais sustentável, que concilia melhor a vida profissional e a familiar. A ideia base é que as pessoas estão "no centro das decisões, e devem usufruir de espaços corporativos com maior função social, de equipa, de reflexo da cultura da empresa.

Como são estes novos espaços?

Estes “escritórios da nova era” devem incluir mais facilities e serviços, como F&B, cafeterias, entretenimento, áreas de desporto, de socialização. A ideia passa sempre por "gerar contacto, aprendizagem e comunidade. E isso é muito complexo, segundo Francisco Vazquez.

Exemplo disso é a Worten, que acaba de se instalar no novo World Trade Center, em Oeiras, num novo espaço com espaços de lazer ao ar livre, Mom’s Club, restaurante, lounge, auditório, rooftop, e vários outros espaços que privilegiam o convívio, explicou Inês de Castro, Head of People da Worten. A tecnologia foi uma grande aposta, nomeadamente através de uma aplicação que permite gerir uma série de informações sobre o escritório, como acessos, consulta de menu do restaurante, salas reservadas, cacifos, etc.

Na experiência da Worten, é importante ter clareza de propósito nesta transformação, e que o espaço tenha o seu ADN próprio. Definir premissas de sustentabilidade e de autonomia, e reforçar a comunicação com a empresa ao longo de todo o processo são também alguns dos pontos essenciais, segundo Inês Castro.

Também o BNP Paribas Fortis tem novos escritórios no Montagne du Parc, na Bélgica, já reconhecidos com prémios MIPIM. "Quisemos flexibilidade, conectividade, mobilidade e sustentabilidade, conta Marianne Kremer, do BNP Paribas Fortis. O espaço tem poucos lugares fixos, muita tecnologia integrada, iluminação adequada, ou estúdios acústicos e mobília ergonómica. Reforçando a aposta na sustentabilidade, um dos principais diferenciais do edifício foi a utilização de 98% do material da demolição do imóvel existente na construção do atual. O edifício é NZEB, e além das vantagens ambientais óbvias, "a ideia é que as pessoas tenham orgulho no seu escritório quando pensam se vão ou não voltar ao local de trabalho, diz a responsável.

Da sensação de perda à flexibilidade

O movimento de revolução dos escritórios não é de agora, já antes da pandemia surgia essa necessidade, e este fenómeno apenas o potenciou e acelerou. Se antes da pandemia a mudança para um posto de trabalho mais flexível gerava uma "sensação de perda de coisas, hoje "este modelo tem de ser voluntário e flexível, e incluir também quem quer ir todos os dias ao escritório, diz o responsável da 3g Office. "O problema agora é encontrar a melhor forma de responder às pessoas com esta liberdade de voltar e que espaços ocupar. Segundo Francisco Vazquez, os mais jovens e a faixa a partir dos 45 anos são os grupos etários de trabalhadores que mais querem estar no escritório, nomeadamente para socializar.

Marianne Kremer recorda que o banco começou esta transformação na Bélgica já em 2012, e que "o processo foi muito doloroso, o espaço de trabalho representa, para muitas pessoas, a ligação física que têm com a empresa. Há quem veja perder o espaço como perder o trabalho. Mas o esforço valeu a pena. Segundo a responsável, contribuiu para a melhor aceitação da mudança a entrega de mais computadores portáteis, instalação de melhor rede wifi, que permitiu maior movimento de colaboradores. Depois, "a pandemia foi a prova para os Managers de que as pessoas são de confiança, e que a equipa continua a ser uma equipa. Foi uma grande mudança, em que as pessoas foram forçadas a tentar, a mudar e a descobrir.

E Inês Castro realça que "teremos sempre pessoas contentes e outras descontentes, a área de recursos humanos e facility management tem de ter consciência disso. Cabe-nos a nós ir gerindo as várias pessoas, e o segredo é escutar muito e fazer os pequenos ajustes necessários, mantendo a linha condutora. Porque "é sempre difícil mudar, as pessoas não desaprendem os seus hábitos em poucos meses, mesmo que o espaço esteja bonito e mesmo que estejam felizes. É preciso dar tempo a estas mudanças.

Alexandra Santos, da CPlace, reforça "a necessidade de ir fazendo estes ajustes necessários e de dar tempo para a adaptação. Certo é que "todos nós devíamos tirar o máximo deste período de transformação, e é necessário "definir um desenho de um modelo que dure no tempo. E um só modelo não dá para todos, pelo contrário.

“É preciso observar e medir”

Francisco Vazquez não deixa de salientar a importância da análise dos dados na tomada de decisões. Segundo o especialista da 3g Office, a ocupação típica da maior parte dos escritórios no “novo normal” deverá rondar os 30%. Usando 50% dos metros quadrados atuais, este exemplo "é um bom business case financeiro para a reforma dos restantes 50%. O investimento é amortizado no espaço de um ano, afirma.

Seja como for, e apesar da estimativa, "é preciso observar e ajustar o espaço físico ao que está realmente a acontecer na empresa, e o facility management tem esse trabalho de ajudar a otimizar os recursos face à atividade da organização.

E porque "só depois de conhecermos os dados é que as decisões podem ser tomadas, até lá, "é preciso fazer pequenos investimentos. Ainda que sejam pequenos, os ajustes aos escritórios podem acontecer de 6 em 6 meses e não de 10 em 10 anos como no passado.