“A reabilitação é prioritária, contribuindo para a construção de melhores cidades”

24/11/2021
“A reabilitação é prioritária, contribuindo para a construção de melhores cidades”

Disse ter como objetivo aumentar, de dois para cinco por cento, o parque habitacional público. Ainda considera este objetivo como “ambicioso”?

O objetivo de aumentar a percentagem de parque habitacional público continua a ser o grande desafio que o país tem pela frente nos próximos anos. Isto porque não temos dúvidas de que um parque público robusto, que assegure respostas dignas, adequadas e a preços compatíveis com os rendimentos das famílias é o principal instrumento que temos para dar resposta às famílias que precisam de uma casa. É de facto um desafio ambicioso, não porque achemos que ele não é possível de alcançar, mas porque partimos de uma base muito deficitária de respostas públicas, num mercado habitacional muito dinâmico. E por isso é um desafio a prosseguir nos próximos anos, se efetivamente pretendermos concretizar, no terreno, uma reforma estrutural em políticas de habitação.

De que forma a articulação entre o Estado e os privados pode ser mais trabalhada na área do arrendamento acessível?

É importante que a prioridade de fundo, atribuída à criação de um parque habitacional público, seja complementada com um conjunto de incentivos e instrumentos dirigidos ao mercado privado, de resultado mais imediato, para responder ao desafio da estabilidade e da maior acessibilidade no arrendamento. O trabalho passa essencialmente pela exequibilidade de medidas em curso e, para tal, é importante percebermos, em conjunto, as melhorias que podem ainda ser feitas nesta articulação. Falo de medidas como o Programa de Arrendamento Acessível, as medidas de promoção de contratos de longa duração, a promoção de Habitação a Custos Controlados, todas elas associadas a um conjunto de incentivos fiscais para a promoção de habitação a preços acessíveis.

Que balanço faz do programa “1.º Direito”?

O programa 1.º Direito é um instrumento sem precedentes na concretização do direito à habitação, tratando o território como um todo e a população de forma igual. Passados cerca de três anos desde a concretização legislativa deste instrumento, a grande maioria dos municípios estão já numa fase final de levantamento exaustivo das suas necessidades e muitos estão já a concretizar no terreno as soluções habitacionais para as famílias.

São já mais de 100 os municípios com as ELH em execução, nas suas várias vertentes e são já mais de 800 as soluções habitacionais prontas a ser entregues às famílias. Este é um bom indicador da vontade de concretizar o Programa no terreno!

Confirma que o Governo vai prosseguir o programa de apoio ao acesso à habitação para além dos 1,2 mil milhões disponibilizados pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)?

Claro que sim. O Programa 1.º Direito foi criado em 2018, em resposta a uma clara necessidade e em prol de uma efetiva justiça social. Trata-se de assumir a habitação como uma política social tão relevante, e de continuidade, como as políticas para a saúde e educação.

O Plano de Recuperação e Resiliência é, em si, um importante instrumento financeiro que permite financiar a 100 % um conjunto de investimento que, sem o mesmo, seriam financiados pelo Estado, grosso modo, em cerca de 50%. Isto é muito importante para a capacidade de execução dos municípios. Mas, como diz, o PRR é um instrumento temporal e materialmente delimitado, não se substituindo ao Programa 1.º Direito, que continuará depois de 2026 e que visa responder a todas as necessidades habitacionais que venham a ser identificadas por cada município.

O que falta fazer no que diz respeito à habitação social?

Falta essencialmente concretizar no terreno o Programa 1.º Direito e o trabalho sem precedentes que os municípios estão a fazer na identificação de todas as necessidades de habitação digna existentes no território.

Garantir que todos, de forma equitativa, têm acesso a uma habitação digna, inclusiva e adequada deve ser o propósito desta reforma estrutural em curso.

Felizmente esse trabalho já está a ser feito por todo o país, mas é importante que o mesmo seja integralmente cumprido, mantendo em permanente atualização as necessidades da população e mantendo em constante utilização um instrumento de resposta a essas necessidades.

Estão criadas as condições para que a reabilitação seja a principal forma de intervenção ao nível do edificado e do desenvolvimento urbano?

A intervenção no edificado deve ter como prioridade máxima a concretização de respostas habitacionais para as famílias, não podendo nem devendo prescindir, por essa razão, de outras formas de política pública de promoção habitacional. Mas a reabilitação é de facto prioritária, contribuindo para a construção de melhores cidades. A par com a majoração que é dada às soluções de reabilitação nos vários programas em curso, há incentivos, programas e instrumentos diretamente associados à reabilitação, como são o Reabilitar para Arrendar ou o IFRRU.

Que impacto o chumbo do OE2022 tem na habitação e imobiliário?

A estabilidade da política pública de habitação e do investimento público é fundamental para não estagnar esta nova visão, estruturante, do papel do Estado na promoção do direito à habitação. Não constituindo um bloqueio na concretização das políticas em curso, obriga, contudo, a um conjunto de readaptações até à sua aprovação durante o ano de 2022.

Entre as novas políticas de habitação, o que acredita terá mais impacto no atual contexto socioeconómico?

Eu diria que a conceção de uma resposta universal de habitação, no seu conjunto, terá um efeito estrutural na sociedade, ao permitir que, a médio e longo prazo, a habitação possa ter uma resposta tão robusta quanto teve e tem o Serviço Nacional de Saúde ou a Escola Pública. Se formos capazes de garantir que ninguém fica privado de um direito fundamental, basilar, como é o direito à habitação, estaremos a dar uma efetiva resposta social para todos os que dela precisam.

O que gostaria de alcançar até ao final deste mandato para sentir que a sua missão foi cumprida?

Mais do que avaliar o que gostaria de alcançar até final do mandato, devíamos falar do que gostaria que fosse salvaguardado depois desse final. A reforma estrutural em curso nas políticas de habitação não é compatível com um ciclo político de 4 ou 8 anos. É uma reforma que deve perdurar no tempo, instituindo verdadeiramente uma área de política social pública, tal como perdura noutros setores fulcrais da sociedade. É uma resposta contínua no tempo, e esse é a grande responsabilidade coletiva que temos. Mas falando do final deste mandato, estabilizados os programas e identificadas as necessidades e as bases de financiamento, a minha missão estará “no bom caminho” se formos capazes de garantir a sua concretização no terreno, seja junto dos municípios, seja diretamente através do IHRU. É importante que, mais do que o compromisso político, sejamos capazes de executar aquilo a que nos propusemos, iniciando todos os procedimentos (muitas vezes, tão complexos do ponto de vista administrativo e urbanístico) para tornar realidade este novo serviço público na área da habitação. O mais importante é que, seja qual for o Governo que saia das eleições de 30 de janeiro, esta estratégia para a Habitação não pare.