Apesar da "apreensão no curto prazo", os investidores imobiliários nacionais e internacionais manifestam um "otimismo cauteloso", disse Hugo Santos Ferreira, vice-presidente executivo da APPII na conferência online “O impacto do Covid-19 no mercado imobiliário”, que contou com a assistência e participação de mais de mil profissionais do setor.
O responsável aponta que "se tudo correr pelo melhor, no final do ano poderemos ter o setor a recuperar. Não vale a pena dizer que não haverá um impacto negativo no setor, nomeadamente a nível da captação de investimento estrangeiro e de paragem de empresas de construção devido a períodos de quarentena". Hugo Santos Ferreira prevê também uma paragem imediata ao nível das vendas, além da suspensão de vários contratos de empreitada.
José Cardoso Botelho, da Vanguard Properties, confirma, mas acredita que esta é uma situação temporária: "Alguns clientes cancelaram as suas reservas, mas isto não representará uma diminuição do interesse, mas sim um atraso. Estamos confiantes de que vamos conseguir resolver esta situação". Já Ricardo Sousa, CEO da Century 21, diz que "estamos agora a registar o cancelamento das visitas aos imóveis, mas algumas aquisições foram apenas suspensas e não anuladas. As pessoas esperam que a situação se normalize para poderem voltar ao mercado".
Os setores ligados ao turismo, nomeadamente o alojamento local, a hotelaria e o residencial, serão os mais afetados, segundo o responsável da APPII. Ou seja, "tudo o que envolver turismo e investimento individual".
Por seu turno, José Araújo, diretor da Direção de Crédito Especializado e Imobiliário do Millennium bcp, acredita que é importante "não entender esta fase como o fim do ciclo interessante que estamos a ter no setor imobiliário, mas sim como um contratempo. A atividade poderá retomar depois a sua normalidade".
Medidas excecionais para tempos excecionais
Neste novo panorama, impõem-se medidas excecionais que poderão ajudar a mitigar os efeitos desta crise. A APPII sugere algumas, como a isenção do pagamento das prestações de AIMI e IMI que vençam até ao final deste ano; uma bonificação do pagamento de IMT no prazo de 6 meses; a suspensão do prazo dos 3 anos para a revenda de imóveis; isenção do pagamento de IRC de julho; a simplificação da burocracia dos licenciamentos, ou novas linhas de apoio à tesouraria que não dependem da redução de faturação.
Pedro Vicente, Board Member da Habitat Invest, concorda com a importância destas medidas, defende a reversão imediata da suspensão dos "golden visa" e destaca que os problemas que vêm de trás não vão ser facilitados neste momento. “Estas medidas podem apenas mitigar os efeitos da crise, mas o Governo deve agora estar focado na crise da habitação, que se vai agravar".
Já José Cardoso Botelho salienta que "as empresas da construção têm de ser muito apoiadas pelo Estado, além das famílias e das empresas em geral", salientando o facto de este setor ter saído há pouco de uma crise profunda, e num contexto de pouca promoção de obras públicas de relevo. "Temos de resolver o problema de acesso à mão-de-obra, nomeadamente simplificando os vistos de quem quer vir trabalhar para Portugal".
Arrendamento de longa duração com nova oportunidade
Em tempo de crise na procura turística, coloca-se a questão se o alojamento local, agora vazio, poderá voltar-se para o arrendamento de longa duração, enquanto a procura turística estiver em baixa. Hugo Santos Ferreira destaca que o mercado de arrendamento pode ter agora uma nova oportunidade. “O alojamento local pode ser encarado em duas perspetivas: quando há procura turística pode ser uma resposta complementar à hotelaria, e quando este vive momentos menos positivos é importantíssimo que se possa voltar esta oferta para o arrendamento de longa duração". Mas deixa o aviso: "é importante que se credibilize o arrendamento. Continua a ser de alto risco e muito instável, com alterações legislativas praticamente anuais", o que tem tido um grande impacto na confiança dos investidores e dos proprietários. José Cardoso Botelho concorda que "a estabilidade legislativa não tem sido conseguida. E vemos consequências, nomeadamente no arrendamento. Esta pode ser uma boa altura para os partidos e o Parlamento pensarem em termos uma fiscalidade estável e seguirmos uma visão de longo prazo".
Ricardo Sousa prevê um aumento significativo das transações de arrendamento neste período, o que segue também a tendência que se tem verificado desde o final de 2019. Atesta que "podemos ver mais imóveis a regressar ao mercado de arrendamento", lembrando que o negócio do AL com pouca escala não é tão rentável: "O grande desafio nos próximos tempos será a liquidez, tanto de famílias como de empresas".