Paulo Caiado
Paulo Caiado
Presidente da Direção Nacional da APEMIP

O 1º Direito ao sabor dos calendários eleitorais e dos ciclos económicos

20/07/2022

Durante alguns anos vivemos à bolina de juros negativos, que vieram atenuar esse esforço coletivo mas que, simultaneamente, e com o passar do tempo, alhearam-nos da nossa realidade.

O Estado procurou gerir a dívida substituindo empréstimos anteriores (com juros mais pesados), por novos créditos a taxas de esforço mais vantajosas e por períodos mais alargados. Mas, ainda assim, o peso da dívida publica estimada para este ano pelo Ministério das Finanças é de 120,8%, a 3.ª mais alta dos 27 países que integram a UE.

O Primeiro-Ministro e o atual responsável das Finanças garantem que a prioridade está na descida substancial do peso da dívida até ao fim da legislatura. Mas a tarefa avizinha-se difícil face à conjuntura e à necessidade de atender ao frágil tecido social.

Por seu lado, as empresas e as famílias, em muitos casos, não o fizeram, ou não o puderam fazer…

O acordar para a realidade deveria ser doce, tranquilo, faseado mas não foi isso que aconteceu ou que está a acontecer. De repente, os sinais acumulam-se naquilo que poderá vir a desencadear uma tempestade perfeita: inflação; subidas das taxas de juro; guerra na Europa com repercussões mundiais, crise energética e alimentar…

Em 2018, António Costa prometia que até 2024, assinalando o 50º aniversário do 25 de Abril de 1974, o Estado iria garantir aquilo que definia como o 1.º Direito: prover habitação condigna a 25.762 famílias em situação de carência habitacional. Os dados resultavam de um Levantamento Nacional das Necessidade de Realojamento Habitacional feito pelo Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana junto dos municípios. Mas a promessa não vai nem pode ser cumprida. Por um lado, pelos atrasos inerentes à tradução em obra no terreno dos dinheiros do PRR (a dita bazuca!); por outro, porque o número de famílias é muito superior ao estimado pelo IHRU (1); e, ainda, porque é impossível prever todas as consequências deste gigantesco ciclone que se move sobre as nossas cabeças.

Outro se avizinha, e a Comissária Elisa Ferreira já deu o sinal em entrevista ao Público esta semana: Nos próximos anos, Portugal vai ter ao seu dispor o maior volume de fundos comunitários de sempre, mas, mais do que o volume o país tem que os usar com qualidade para chegar a um patamar de “desenvolvimento normal”, referia. Acrescentando: O País «tem que se libertar da dependência dos fundos europeus».

Não pode deixar de ser, no momento em que é anunciado que a Albânia e a Macedónia do Norte receberam a luz verde de Bruxelas para o início das negociações de adesão. E outros se deverão seguir: Montenegro, Sérvia, Ucrânia e Turquia.

(1) Dos 308 municípios inquiridos pelo IHRU, apenas cerca de 61% responderam ao Levantamento Nacional das Necessidade de Realojamento Habitacional. E segundo estimativas baseadas nas Estratégias Locais de Habitação, pensa-se que elas poderão superar os 85.000 casos.