Manuel Reis Campos
Manuel Reis Campos
Presidente da CPCI e da AICCOPN

AR aprova alterações ao CCP. País perde e o Setor também

21/04/2021

Apesar de estarmos de acordo com a introdução das medidas de controlo da legalidade que estiveram na origem do “veto” do Senhor Presidente, continuamos preocupados, já que as soluções apresentadas continuam a passar ao lado dos grandes problemas estruturais da contratação pública que identificámos no parecer enviado ao Parlamento no âmbito da respetiva consulta pública.

Efetivamente, para além de introduzir medidas como o reforço do papel do Tribunal de Contas ou a criação da Comissão Independente que irá acompanhar e fiscalizar os procedimentos e a execução dos contratos públicos celebrados ao abrigo do regime especial de contratação pública, a verdade é que, na sua essência, o Diploma que foi aprovado mantém-se quase inalterado relativamente à versão original que contestámos. Questões como o cálculo irrealista dos preços base; a falta de critérios obrigatórios e uniformes para identificação de propostas de preço anormalmente baixo; a diferenciação dos regimes de liberação das cauções consoante as obras sejam localizadas no Continente ou nas Regiões Autónomas, ou a interoperabilidade das Plataformas Eletrónicas são alguns exemplos de matérias que deveriam ter sido contempladas com soluções concretas e que, lamentavelmente, não foram objeto de qualquer tratamento.

Desta forma, as alterações ao CCP vão ignorar matérias críticas que são particularmente relevantes quando se espera iniciar um novo ciclo de investimentos indispensáveis à retoma e desenvolvimento do País, designadamente ao nível do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e da execução do Portugal 2020, que se encontra na sua fase final.

E vão, ainda, agravar um dos aspetos mais contestados da atual lei, o regime de erros e omissões, que ao desresponsabilizar o dono de obra e transferir toda a responsabilidade para as empresas, constitui um retrocesso inaceitável a uma reforma que tem pouco mais de três anos. Está em causa que a mesma “categoria/tipo” de erros e omissões passe a ter de ser detetada em dois momentos autónomos e só em cada um deles (dentro do primeiro terço do prazo para a apresentação das propostas e nos 60 dias após a consignação), sob pena do empreiteiro responder por 50% do seu valor, o que se prevê venha a ser fonte de conflitos, com consequências evidentes ao nível do andamento das obras, pois tecnicamente será muito difícil determinar quais os erros que deveriam ser reclamados no primeiro terço do prazo e aqueles que teriam de ser detetados após a consignação.

A capacidade de tirar partido dos recursos comunitários que estão a ser colocados à nossa disposição para reativar a economia, criar emprego e concretizar os investimentos estruturantes, sem colocar em causa a transparência e a celeridade dos procedimentos, é possível. Mas estas alterações ao CCP não serão suficientes para alcançar esse objetivo, pois, na prática, não irão resolver, os principais problemas da contratação pública que têm impedido a concretização atempada dos projetos ao longo dos anos, perdendo o País e o Setor.