Todos conhecemos alguns países governados em moldes com os quais a generalidade de todos nós não se identifica – e não os considera um exemplo -, e onde as pequenas intervenções governamentais são meramente e unicamente assistencialistas. Por isso, espera-se que estas medidas sejam, preferencialmente, utilizadas como um mecanismo de emergência e não como uma solução de longo prazo.
Por cá, e em particular no setor imobiliário, é claro que ao se ter deixado que a escassez de habitação e respetivos custos evoluíssem para a conjuntura atualmente conhecida – colocando-nos perante uma situação de emergência -, é óbvio que o Governo sentiu a necessidade de ajudar. Neste caso é também importante não esquecer que, neste setor, a ajuda tem sempre um duplo sentido. Quando o Governo apoia os inquilinos no cumprimento das suas rendas, é claro que está também a ajudar os proprietários, que de outro modo teriam os seus inquilinos em incumprimento. Quando o Governo ajuda as famílias que têm créditos hipotecários a cumprir com as suas obrigações, é claro que também está a ajudar os bancos, no sentido de evitar que os seus clientes entrem em incumprimento.
Porém, os efeitos perversos podem surgir deste espoletar de gratidão perante uma dificuldade e, por outro, porque podem facilmente excluir aquelas soluções que, do ponto de vista estrutural, contribuiriam efetivamente para a ausência destas necessidades assistencialistas. Mas se a ajuda é muito bem-vinda perante tantos e diferentes intervenientes que seguramente se sentem gratos, da mesma forma, todos devemos continuar a exigir medidas estruturais que permitam, num futuro, não haver dívidas de gratidão. Acontece ainda que, aos governantes, a gratidão expressa-se em votos, e eles sabem disso. É responsabilidade de todos exigir que medidas caracterizadas por assistencialismo não sejam indissociáveis de programas estruturais que tenham por objetivo corrigir o que merece ser corrigido.