Comentava nessa altura as conclusões dum estudo realizado pelo banco europeu de investimento, a saber: nítida falta de habitação acessível; baixa produtividade, insuficiente inovação, custos altos e tempos de entrega demorados do setor construção; e quase um quarto do parque edificado com a classificação de pobreza energética. Notava, igualmente, a ambição duma plataforma de financiamento de €10B destinada a apoiar a inovação na construção, a eficiência energética e a renovação do parque edificado; i.e., 1,5M de unidades habitacionais novas ou renovadas. Referia, finalmente, os pilares do próximo plano europeu de habitação acessível: estabelecimento de parcerias complementárias das estruturas políticas e produtos de investimento existentes; foco específico nos países com sistemas de habitação menos maduros e/ou necessidades mais prementes; fomento da inovação, incluindo novas tipologias de habitação e propriedade; e mobilização dos promotores imobiliários.
Nesse tempo, e apesar de não dispor de competências efetivas na matéria de habitação, Bruxelas tem formado algum grupo de trabalho específico com o propósito de conhecer, no terreno, as distintas realidades habitacionais dalguns países membros, por via de encontros com associações, entidades, instituições e agentes económicos que permitam avaliar possíveis rotas e eixos de progresso, em função das situações particulares. Essa atitude denota a consciência de que, sendo o problema da habitação acessível comum a muitos países da união, é preciso levar em linha de conta as conjunturas nacionais para tentar desenhar um plano europeu que, sendo o primeiro do seu género, tenha alguma hipótese real de atacá-lo. Como exemplo, basta compreender que alguns países têm um quarto do parque habitacional alocado à habitação social enquanto outros não conseguem atingir os 5% do mesmo. Trocado por miúdos: as eventuais soluções a propor pelo grupo de trabalho ao primeiro comissário europeu de habitação devem contemplar as necessidades habitacionais de cada país, mas também as diversas políticas nacionais adjacentes (fiscal, turística e de planeamento do território, entre outras).
É claro que a Comissão Europeia pode sugerir (ou até solicitar) aos países membros que façam isto ou aquilo (por exemplo, aumentar a oferta de solo disponível para habitação acessível, limitar a proliferação do alojamento local, controlar a evolução das rendas em zonas tensionadas, reforçar as iniciativas conducentes ao incremento do parque público, acelerar a concretização dos fundos associados a planos de recuperação ou coesão, ou reduzir os prazos administrativos inerentes à construção e renovação de edifícios), mas, a verdade, é que tem pouco espaço de manobra concreta para fazer face à urgência da situação, após anos de desídia política. Assim sendo, faz sentido que as iniciativas propostas pelo grupo de trabalho se venham concentrar em assuntos como a mobilização de fundos comuns (do tipo Next Generation), a criação de instrumentos financeiros (não especulativos) dedicados à disponibilização de habitação acessível, as boas práticas de determinadas cidades ou países, a redução de custos e aumento da produtividade no processo construtivo, a captação, formação e retenção de mão de obra de qualidade… Sem deixar de parte a melhoria urgente (e não apenas no respeitante à eficiência energética) do parque edificado.
A última nota (positiva) deste artigo deve ir, forçosamente, para a consulta pública lançada há uma semana pelo executivo comunitário (irá prolongar-se até meados de outubro), no propósito de solicitar o contributo dos principais atores dos mercados de habitação e como forma de aproximar as curvas da oferta e a procura. Aplica-se, parece-me, o poema do Antonio Machado: “Caminante, son tus huellas el camino y nada más / Caminante, no hay camino, se hace camino al andar”.