Trata-se duma proposta para a construção dum sistema europeu destinado à gestão do risco das, cada vez mais, frequentes e severas catástrofes naturais, procurando a redução do impacto económico-financeiro derivado das alterações climatéricas, e reconhecendo a crescente brecha na proteção seguradora desses riscos (apenas um quarto dos 900 mil milhões de euros de perdas diretas, entre 1981 e 2023). O documento que corporiza a proposição divide-se, essencialmente, em três partes: uma, destinada ao desafio crescente da segurabilidade das catástrofes naturais; outra relativa às lições aprendidas com os diferentes sistemas de seguro nacionais vigentes; e a última, respeitante às possíveis aproximações a um sistema público-privado de resseguro europeu.
Em relação à primeira, parece bastante claro que, caso se mantenha o status quo, o aumento no número, na gravidade e na imprevisibilidade dos eventos catastróficos irá provocar três consequências diretas: por um lado, haverá menos intervenientes (de primeira e segunda linha) disponíveis para segurar ou financiar os riscos ligados aos fenómenos extremos da natureza; por outra parte, densificar-se-á a formação de preços para aquelas coberturas mais escassas que continuem disponíveis; e, finalmente, criar-se-á uma segmentação perniciosa para os atores económicos (indivíduos e empresas) com autonomias financeiras menos robustas e/ou localizados nas zonas com maior probabilidade de ocorrência de catástrofes naturais. Em resumo, as estruturas tradicionais de seguro deixariam de ser capazes de reduzir a incerteza financeira dos agentes económicos que operam no mercado, ao passo que este último detetaria a incapacidade daqueles para gerir em segurança as perdas acidentais da sua atividade, condenando-os à desconfiança em matérias críticas para o normal funcionamento do modelo económico (capacidade de devolução de empréstimos, reconstrução e/ou recuperação de ativos, continuidade na geração de valor…). Por outras palavras, o seguro já não poderia exercer corretamente a sua vital função e o seu propósito de proteção a baixo custo teria de ser assumido pelo financiamento a alto custo das arcas públicas.
No tocante à segunda, as lições aprendidas refletem-se na necessidade de preparação dos sistemas de resposta e emergência nacionais (incluindo aqui os programas público-privados de seguros transversais), na adoção de modelos de mitigação de riscos e, obviamente, na adaptação de esforços destinados à prevenção das ocorrências e à minimização das perdas derivadas da sua eventual materialização. Nota-se, ainda, que o Fundo de Solidariedade da União Europeia não consegue responder, nem concetual, nem estruturalmente, aos desafios materiais da reconstrução das zonas atingidas por eventos catastróficos… conclusão que, já agora, seria perfeitamente aplicável aos esforços individuais de resposta conjuntural (não sistémica) dos estados-membros quando confrontados com situações idênticas. Dito doutra forma, o tema dos acontecimentos climatéricos de natureza extraordinária não se pode tratar avulsamente.
Quanto ao que fazer, o BCE e a EIOPA advogam por um modelo que, suportado nas estruturas nacionais e europeias já existentes, introduza mais uma solução “UE” fundamentada em dois pilares. O primeiro corporizaria um programa voluntário e com economias de escala de resseguro público-privado, na base da mutualização e diversificação dos riscos do setor privado, no propósito de aumentar, com recurso aos respetivos prémios, a cobertura de seguro de natureza catastrófica nas zonas críticas. O segundo materializaria um fundo destinado a financiar os impactos de desastres públicos, baseado na melhoria da gestão pública dos riscos catastróficos extraordinários.
É apenas um princípio, mas ele promete…