Manuel Reis Campos
Manuel Reis Campos
Presidente da CPCI e da AICCOPN

Censos 2021: Em Portugal, degradam-se mais casas do que aquelas que se constroem ou reabilitam

30/11/2022

E, desde logo, deparamo-nos com um número muito preocupante, que traduz uma realidade que reflete exatamente os problemas para os quais temos vindo a alertar, mas que são frequentemente ignorados. O número de edifícios com necessidades de reparação, que era de 1.024.937 nos Censos de 2011, situa-se agora em 1.278.826.

Ou seja, Portugal tem, atualmente, mais 253.889 edifícios a necessitar de intervenção do que o verificado há dez anos. Em termos relativos, isto significa que, se em 2011, 28,9% do parque habitacional precisava de obras, em 2021 esse peso já era de 35,8%.

E, se olharmos para o número de edifícios que necessitam de intervenções significativas, ou seja, com necessidades médias ou muito profundas, o cenário não é mais animador. Verifica-se um aumento de 98.085 edifícios nestas condições, ou seja, numa década passamos de cerca de 400 mil edifícios a necessitar de obras significativas, para um total de praticamente meio milhão, dos quais 163 mil estão em muito mau estado.

Veja-se que, nestes mesmos 10 anos, o número de edifícios cresceu apenas 29.027, ou seja 0,8%. O total de obras licenciadas neste período (2002 a 2021), foi de cerca de 130 mil, dos quais 96 foram construções novas e 34 mil reabilitações.

A conclusão é óbvia. Em Portugal, onde a Habitação foi reconhecida como uma prioridade estratégica, sendo mesmo a componente com maior dimensão do PRR, não temos sido capazes de assegurar a manutenção do nosso parque habitacional, quanto mais de responder às necessidades de aumento de oferta e de resposta às necessidades das populações. Continuamos a apontar o dedo ao Alojamento Local e aos programas de captação de investimento estrangeiro, como os Vistos Gold e a ignorar a dura realidade de um País onde, anualmente, se degradam mais casas do que aquelas que são construídas ou reabilitadas.

Que estes números sirvam, ao menos, para uma reflexão profunda e uma alteração de paradigma da política de habitação. Os avanços que reconhecemos serem positivos no investimento em habitação pública e que esperamos ver concretizados, têm de ser acompanhados de uma alteração perante o investimento privado. Estabilidade e segurança jurídica, deixar de olhar para o imobiliário como uma fonte inesgotável de impostos e eliminar tributações desajustadas como o AIMI e alargar o IVA a toda a Habitação, incluindo a construção nova, resolver os estrangulamentos burocráticos do licenciamento e de questões tão básicas como uma mera ligação à rede da água e da eletricidade, que por vezes demora meses, o que é incompreensível, são algumas das medidas que temos defendido e são essenciais, como estes números bem demonstram.

Num contexto em que a eficiência energética do edificado é assumida, à escala europeia, como um vetor prioritário de intervenção, não podemos ficar indiferentes perante estes factos. E, como temos afirmado, só com uma visão global e uma estratégia de dinamização do investimento privado poderemos inverter esta realidade que é insustentável do ponto de vista social e ambiental.