Francisco Campilho
Francisco Campilho
Presidente da Comissão Executiva da VICTORIA Seguros

Diz-me o que tens e onde

03/03/2021

No entanto, algo que deveria ser mais constante ao longo do tempo acaba por apresentar alguma variabilidade e também ciclos que acompanham as tendências de urbanismo, do consumo, das perceções, mas também das alterações legais que interferem na sua caraterização.

A variabilidade do critério de localização ao longo do tempo fica, por exemplo, evidente quando vemos a evolução do tabuleiro do jogo do Monopólio. Recordo-me que nos anos 70 uma das propriedades azuis escuras (as mais valiosas e vizinhas da “taxa de luxo”) era a Rua Augusta em Lisboa. Soube mais tarde que as propriedades desta cor passaram a ter outras moradas, que já não acompanhei, mas que correspondiam à evolução da cidade, do seu comércio e do impacto de o enquadramento legal do arrendamento.

A localização da Rua Augusta ficou menos apetecível perante uma cidade que se expandiu para as Amoreiras e mais tarde para a Expo. No entanto, com a evolução do turismo, as alterações do regime de arrendamento, a zona da Baixa voltou a ganhar uma valorização que lhe era devida pela sua localização central e histórica. E não só reconquistou hotéis e comércio como voltou a ter uma oferta habitacional, e de topo, que não tinha desde o final do século XIX.

Ou seja, a localização pode ter ciclos, mas mantém-se como o fator determinante na valorização de um investimento imobiliário. E a localização pode ser medida objetivamente por dois critérios de proximidade: a de atividades profissionais e a de comércio e serviços.

Para a proximidade de atividades profissionais não é apenas relevante a distância física, mas também a distância temporal. As ligações viárias, ferroviárias e outras contribuem decisivamente para o encurtamento desta distância temporal. No caso da proximidade de serviços e comércio apresentam-se como relevantes não só a oferta de escolas e lojas, mas também a de equipamentos culturais e desportivos. Resumindo, a palavra chave da proximidade é a acessibilidade.

Outros critérios clássicos de localização (e valorização) de um imóvel são a vista (de mar, de rio ou de serra), a sua exposição solar e crescentemente outros requisitos ambientais como o nível de ruído ou de poluição do ar.

No entanto, neste momento estes critérios estão a ser desafiados pela evolução tecnológica que veio alterar também a nossa perceção de acessibilidade. Hoje, as distâncias físicas e temporais da atividade profissional perdem importância com a generalização do teletrabalho. E, por outro lado, os fatores ambientais ou mais qualitativos como a vista ou qualidade do ar ganham relevância na procura de habitações. A revolução em curso no mundo do trabalho foi acelerada pelas estratégias de combate à pandemia, nomeadamente o confinamento. Estas alterações, que terão impacto na evolução das cidades e do seu até agora imparável crescimento, vão fazer a prazo alterar novamente o tabuleiro do Monopólio trazendo novas localizações para o “jogo”. E o “onde” do título do artigo poderá novamente alterar-se e quem sabe deixar de ser apenas urbano e passar a incluir outras localizações mais rústicas.