Hugo Santos Ferreira
Hugo Santos Ferreira
Presidente da APPII

O que esperar de um novo Governo?

16/02/2022

Portugal, os portugueses e o sector imobiliário podem esperar do novo Governo a tomada de todas as medidas necessárias para resolver, sem a pressão e a desculpa dos partidos mais radicalizados à esquerda (que tanto prejudicaram a criação de políticas públicas eficazes), o problema da Habitação. Havia por parte do anterior Governo e da Tutela (facto que testemunhámos) já a vontade em combater este drama nacional, vontade essa que muitas vezes foi prejudicada pelas tais pressões externas ao próprio Executivo. Tempos novos, exigem assim novas ambições, para a resolução de velhos problemas.

Desde logo, temos de criar um mercado de arrendamento. O arrendamento em Portugal é, na sua maioria, constituído por micro, pequenos e médios proprietários, que não conseguem sozinhos criar um verdadeiro, pujante e dinâmico mercado de arrendamento de longa duração, que consiga responder à enorme procura. Há vários players, nacionais e internacionais, de grande monta que pretendem realizar em Portugal projetos de arrendamento de longa duração, com muita escala e a criação de milhares (sublinho milhares) de fogos. Mas para isso é preciso criar as condições para que eles possam avançar com os seus projetos. O mercado de “build to rent” é uma das maiores dinâmicas de investimento da Europa e floresce lá fora, merecendo a atenção de investidores, fundos e fundos de pensões um pouco por todo o Mundo. Estes investidores “olham” para Portugal, já que temos a procura, mas infelizmente não temos um quadro legislativo e fiscal estável, credível e interessante, que lhes permita avançar.

Urge, por isso, credibilizar o arrendamento, estabilizando o seu regime jurídico, que na última década foi alterado mais de 10 vezes, equivalente a mais de uma vez por ano. Devemos também estabelecer um acordo de regime para a estabilização do seu sistema fiscal, tudo numa lógica de longo prazo, criando medidas que gerem confiança no investimento a largo prazo e dando as condições necessárias para que os investidores possam desenvolver os seus projetos a 15/20 anos. Temos também de arrepiar caminho de um modelo de confisco crescente sobre o património imobiliário português e de um modelo de desculpabilização e desresponsabilização do inquilino incumpridor. Mais, temos de acabar com a maior aberração fiscal em Portugal que é o AIMI, há muito que este duplo e transitório imposto deveria ter acabado.

Outro dos passos a dar para se criar um verdadeiro mercado da habitação aos portugueses passaria por resolver o aumento galopante dos custos de contexto aplicáveis à produção imobiliária, em especial reduzindo o IVA na construção nova habitacional, ou pelo menos torná-lo dedutível. O IVA para habitação à taxa máxima não dedutível é uma exceção na Europa, sendo um dos maiores óbices ao avanço de projetos de construção nova para habitação, para venda ou arrendamento.

O primeiro passo já foi dado e bem pelo anterior Governo, ao permitir, em Dezembro do ano passado, que os promotores imobiliários pudessem beneficiar do regime do IVA reduzido de 6% em projetos do Programa de Arrendamento Acessível do Estado. Estamos no caminho certo. Cabe agora avançarmos e irmos mais longe.

A generalização da aplicação de uma taxa reduzida do IVA ou a sua dedutibilidade a todos os projetos de construção nova habitacional acessível aos portugueses visaria, desde logo, mitigar os outros custos de contexto, nomeadamente preços exorbitantes dos terrenos para construção e edifícios a reabilitar, a falta de capacidade instalada e de mão-de-obra, o aumento do custo das matérias-primas e mesmo da construção e depois visaria ainda criar um modelo de incentivo real ao investimento em mais habitação para a classe média e também para o arrendamento, de tal forma que envolvesse também os promotores e investidores de construção nova, que dispõem de uma enorme capacidade para aumentar exponencialmente a oferta de novos fogos.

Se aplicarmos um IVA reduzido na construção de toda a obra nova para habitação destinada à classe média estamos a indicar um caminho que os privados podem seguir. Esta foi a estratégia tida com a reabilitação urbana, que resultou muito bem: as nossas cidades, que antes estavam em avançado estado de ruína e caminhavam para um índice de degradação inaceitável, devem a sua regeneração a esta redução do IVA.

Os promotores e investidores imobiliários estão disponíveis e totalmente interessados em ajudar o País na construção de mais habitações para os portugueses, mas para isso precisam ver viabilizados este tipo de projetos. Sem medidas eficazes e corajosas, como estas, tememos que as nossas famílias continuem a ter de habitar em imóveis degradados, superlotados, sem as condições mínimas de habitabilidade e que representam um esforço financeiro excessivo para o agregado familiar.