Rui Ribeiro Lima e Miguel Arnaud de Oliveira
Rui Ribeiro Lima e Miguel Arnaud de Oliveira
Sócio da Morais Leitão | Consultor da Morais Leitão

A habitação no centro da alteração ao RJIGT

11/02/2025

O ano de 2024 foi profícuo em alterações ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (Decreto-Lei n.º 80/2015, de 30 de maio, doravante referido como RJIGT). Com efeito, sem que tenha ainda decorrido um ano desde a publicação do chamado Simplex Urbanístico (Decreto-Lei n.º 10/2024, de 8 de janeiro), o fim do ano de 2024 viu ser publicada em 2024 uma segunda alteração ao RJIGT, mais concretamente através do Decreto-Lei n.º 117/2024, de 30 de maio.

E, na verdade, pode esta alteração não ser a última por força da apreciação parlamentar que se encontra a ser feita ao referido diploma. Ora, ainda que possa ocorrer algum risco de desatualização do presente artigo, importa destacar as novidades introduzidas pela pelo Decreto-Lei n.º 117/2024.

Em primeiro lugar, foi modificado o regime especial de reclassificação para solo urbano com finalidade habitacional, aliás a medida que tem sido objeto de maiores críticas. É de destacar que a alteração em causa veio estabelecer, por um lado, a possibilidade de conversão de solo rústico para solo urbano tendo em vista finalidades conexas a esse uso habitacional e usos complementares, configurando um alargamento quanto aos fins anteriormente previstos.

A lei não especifica que tipo de finalidades conexas ou usos complementares podem estar em causa, deixando assim tal tarefa para a praxis.

Por outro lado, um dos aspetos que tem merecido maior censura e crítica é o facto da reclassificação de solo para as finalidades acima referidas poder abranger determinadas áreas integradas em restrições de utilidade pública, como sendo determinados solos em Reserva Ecológica Nacional ou Reserva Agrícola Nacional.

Dentro ainda da reclassificação para uso habitacional, outra das novidades protagonizadas pelo Decreto-Lei n.º 117/2024 é a exigência de que 70/1000 da área total acima do solo ser destinada a habitação pública ou a habitação de valor moderado, correspondendo este conceito a uma inovação face ao anterior regime.

Entende-se por “habitação de valor moderado” aquela em que o preço por m2 de área bruta privativa não exceda o valor da mediana de preço de venda por m2 de habitação para o território nacional. Caso o valor por m2 de área bruta privativa seja superior ao valor da mediana, não pode ser 125% do valor de mediana de preço de venda por m2 de habitação para o município da localização do imóvel até ao máximo de 225% do valor da mediana nacional.

Em segundo lugar, contrariamente ao que se previa na proposta inicial, foi mantido o procedimento simplificado de reclassificação dos solos para instalação de atividades industriais, de armazenagem ou logística, uma medida que permite incrementar a competitividade de Portugal no mundo pela atração de importantes investimentos neste domínio.

Por fim, em terceiro lugar, é de saudar a clarificação das regras relativas às consequências para o incumprimento da inclusão das regras de classificação e qualificação do solo nos planos municipais de ordenamento do território.

É que dúvidas existiam sobre o que sucederia às normas dos planos municipais de ordenamento do território aplicáveis à totalidade da área do município após o prazo de 31 de dezembro de 2024. O que decorre da alteração agora feita pelo Decreto-Lei n.º 117/2024 ao artigo 199.º do RJIGT é que apenas ficam suspensas as normas dos planos municipais de ordenamento do território que incidam sobre as áreas de solo urbanizável ou de urbanização programada, e nenhumas outras.

Por outro lado, também é manifesto que tais normas não ficam suspensas nas situações em que o solo já tenha adquirido as características de solo urbano ou mesmo não tendo adquirido, decorra prazo de execução de obras de urbanização, previsto em plano de pormenor, contrato de urbanização ou ato administrativo de controlo prévio.