Mas há um aspeto que me preocupa profundamente, e que raramente é discutido com a devida atenção: é a qualidade do que se constrói e reabilita.
Ter uma casa é mais do que ter um teto. É ter conforto. É viver num espaço onde não se passa frio no inverno nem um calor sufocante no verão. Onde a fatura da luz não pesa tanto que se torna insustentável. Onde se respira bem, se descansa melhor e se vive com dignidade.
A verdade é que, apesar dos avanços dos últimos anos, uma parte significativa do parque habitacional em Portugal continua a ser energeticamente ineficiente. Muitas dessas casas foram construídas noutras décadas, com outras exigências e prioridades. E mesmo nos projetos mais recentes, ainda vejo a eficiência energética ser tratada como um complemento quando, na verdade, devia ser um critério essencial desde o seu projeto.
É precisamente aqui que sinto que temos uma responsabilidade comum, seja como setor, como decisores ou como país. A transição energética não se faz apenas com painéis solares ou carros elétricos. Faz-se, sobretudo, nas casas onde as pessoas vivem. E é aí que temos de garantir que as soluções técnicas, o conhecimento e os apoios certos chegam de forma clara, prática e justa a todos os cidadãos.
Na ADENE, assumimos com clareza o nosso papel neste desafio. Trabalhamos para que a eficiência energética deixe de ser vista como um detalhe técnico e passe a ser um pilar da habitação em Portugal. Apoiamos os cidadãos, as empresas e os municípios, promovemos soluções na reabilitação e fornecemos as ferramentas a quem quer fazer diferente. A nova diretiva europeia para o desempenho energético dos edifícios (EPBD), veio acelerar a exigência sobre o parque edificado. Imóveis com fraco desempenho energético vão perder valor e atratividade. Estar preparado não é uma opção, mas sim, uma vantagem competitiva.
Para vencermos esta batalha, é fundamental estarmos preparados. Precisamos de políticas públicas coerentes, de mais literacia energética no setor e de modelos de financiamento que não excluam quem quer construir melhor. É urgente estabelecer regras claras, justas e estáveis. Habitação acessível não pode continuar a significar habitação de baixa qualidade. E construir mais, por si só, resolve muito pouco se continuarmos a repetir os mesmos erros do passado.
O conforto, a saúde, os custos e a valorização de um imóvel estão diretamente ligados ao seu desempenho energético. Ignorar esta realidade é prolongar os problemas do passado e adiar soluções que já deviam estar no presente.
É tempo de fazer da eficiência um pilar da habitação. Temos de garantir que todas as casas oferecem mais do que abrigo. Têm de oferecer futuro, conforto real, proteção contra a incerteza energética, instabilidade política e geopolítica e capacidade de resistir às exigências do clima e do tempo. Para isso, não basta vontade técnica ou soluções disponíveis no mercado. O desafio exige um pacto político duradouro capaz de garantir políticas consistentes e medidas estruturais que sobrevivam aos ciclos políticos, como o licenciamento ágil, incentivos fiscais e regras claras que valorizem a qualidade e o desempenho dos edifícios, geradoras de estabilidade, visão estratégica e compromisso coletivo. Só assim e com a energia certa, será possível assegurar habitação acessível, mas também digna, confortável e preparada para o futuro.