Paulo Caiado
Paulo Caiado
Presidente da Direção Nacional da APEMIP

É importante preservar o mercado.

16/06/2021

É por isso, um mercado que deve ser preservado, cuidado e de algum modo acarinhado.

Aquando da última intervenção da “troika”, muitos de nós recordam-se da frequência com que ouvíamos falar dos mercados e das suas consequências nas nossas vidas pessoais. Na altura eram muitos os que se questionavam sobre esses mercados, afinal quem eram, onde estavam, que língua falavam, queríamos conhecê-los…

Mas regressemos ao outro, aquele que é bem conhecido de todos, relativamente fácil de compreender, o que deve ser preservado e cuidado: o imobiliário.

Ouvi dizer que há sessenta anos atrás, em algumas cervejarias de Portugal, quando alguém pedia uma imperial, serviam para acompanhar um prato de camarão em vez dos atuais tremoços.

Imagino que ao longo dos anos o camarão tenha subido muito de preço, ou que haja menos camarão, ou tenha havido muitos clientes alérgicos a camarão, certo é que atualmente na melhor das hipóteses temos tremoços, ou, em alternativa continuamos a ter camarão, mas temos de pagar.

Não consigo imaginar qualquer medida legislativa, subvenção, apoio ao camarão, camarão acessível que tivesse como objetivo trazer de volta a tradição ou hábito de servir imperial com camarão.

Parece-me muito bem que alguém ambicione viver no centro de uma Grande Cidade Europeia como Lisboa ou Porto ou Santarém ou Faro, ou Évora, ou a Vila de Óbidos e parece-me bem que sendo uma dessas, a escolha vá para aquele lugar lá bem no cocuruto do sítio.

Acho que a minha escolha iria para o Rossio, de preferência de frente para o Teatro.

Mas temos de pagar se pudermos, ou procurar uma alternativa se não pudermos pagar no Rossio. Não podemos, não devemos impedir que quem tem uma casa no centro de uma cidade seja condicionado em usufruir tudo o que o tal mercado (o imobiliário) tem, para o bem e para o mal.

Quando alguém decidiu vender e outro decidiu comprar um prédio lá bem no centro por uma “data “ de dinheiro, aquele que comprou, acredita que vai converter aquele prédio velho num fantástico prédio novo, acredita que pode pagar a um fantástico Arquiteto o desenho daquele prédio novo, acredita que pode pagar a uns fantásticos Engenheiros, o estudo do prédio, acredita que as autoridades responsáveis por emitir licenças, fiscalizar, certificar, tudo farão em prazos também eles fantásticos, para, finalmente vender o prédio ou os apartamentos a alguém que também acredita que está a tomar uma boa decisão ao comprar aquele imóvel; e temos claro o primeiro que vendeu por uma “data” de dinheiro e que agora vai comprar uma casa fantástica em Tomar, ou Silves, terra dos seus Pais, ou vai ajudar o filho num negócio que gostava de desenvolver, ou…

É mais ou menos assim de simples, ninguém esperava que a Lehman Brothers falisse, ninguém esperava o Covid-19, ele (o mercado) é relativamente fácil de compreender, mas não é perfeito, no entanto tudo se complica quando se tenta que não seja assim de simples.

Se o Estado ou o Governo hoje, quisesse manter o camarão com imperial, como faria? Financiava o camarão ou baixava o preço da imperial, ou poderia criar zonas de contenção, zonas onde a imperial é obrigatoriamente acompanhada de camarão, poderia também optar por zonas de exclusão, “Shrimp Free Zone”.

Em qualquer caso a trapalhada seria garantida.

Dizemos mercado, como um espaço de trocas comerciais, porque é realmente isso o mercado imobiliário, um mercado.

É também por isso que não consigo imaginar alguém lembrar-se de fazer uma lei a proibir a venda de camarão no mercado da Ribeira e no mercado do Bulhão.

Na Ribeira e no Bulhão não se compra camarão, agora só se vende no interior do País.

Conseguiria até compreender que alguém fizesse uma lei que proibisse a compra de camarão em Portugal.

Em Espanha, Malta, França, etc., pode comprar-se camarão, cá não. Ou por causa do colesterol, ou porque estão ameaçados, ou porque é injusto uns comprarem camarão outros não, acabou o camarão. Mas seria algo muito desajustado onde no mínimo havia a equidade do tremoço.

De volta à realidade está tudo bem com o camarão exceto na Ribeira e no Bulhão.

Os Cidadãos Estrangeiros com capacidade para comprar imenso camarão, que gostam de Portugal, que estão dispostos a afetar fluxos financeiros de grande significado, que são atraídos pela possibilidade de obterem um visto de Residente, sujeito a renovações, parece que não vão poder comprar em Lisboa e Porto, sendo-lhes reservada uma mancha territorial que alguém desenhou, imaginando que poderia estar a cuidar, preservar, mimar o mercado imobiliário.

De facto é obrigação de todos os intervenientes preservar o mercado que tão importante tem sido para todo um País, o tempo tem mostrado que a melhor forma de o cuidarmos é deixá-lo em “paz” deixá-lo funcionar, deixar que os fluxos de procura e oferta se encarreguem de gerar os preços que o mercado absorve.

O mercado tem aspetos imprevisíveis, principalmente associados a variantes que não controlamos, como as taxas de juro de mercados financeiros, pandemias, falências inesperadas, é por isso que aqueles que podem, devem conferir-lhe mais previsibilidade e para isso não alterar sistematicamente as regras, os programas de incentivo à captação de investimento estrangeiro, a legislação relativa às diferentes tributações prediais, as taxas, os programas de reabilitação urbana, entre outros.

Há sessenta anos atrás, serviam camarão a acompanhar imperial, mas não vivíamos tão bem.