Paulo Caiado
Paulo Caiado
Presidente da Direção Nacional da APEMIP

Mais ideologia, mais habitação

15/03/2023

Mas, além das particularidades das medidas, talvez seja importante refletir sobre os seus objetivos estruturais. 

A grande questão é, como é que isso se faz. Talvez devamos começar por seriamente clarificar o que é que está "em cima da mesa". São questões de teor ideológico, que têm por objetivo mudar o nosso modelo social, ou
são questões técnicas que procurem identificar soluções que correspondam às atuais preocupações no domínio da habitação.

Empobrecer 73% das famílias Portuguesas nada terá de técnico e tudo terá de ideológico. Quatro milhões de famílias Portuguesas são proprietárias de um imóvel, destas 37% está a pagar a sua casa ao banco. No valor das suas casas está armazenada a mais relevante poupança das famílias Portuguesas. Quando um casal se separa, e precisa de vender a sua casa para recomeçar as suas vidas, o valor da casa importa. Quando um casal tem filhos e precisa de vender a sua casa para comprar outra maior, o valor da casa importa. Quando uma avó morre e é necessário vender a casa, o valor da casa importa. Importa, importa sempre e muito.

O que seria ótimo era termos o nosso Estado a auxiliar a consistência e a robustez do valor das casas. Não queremos que subam desmesuradamente e não deveríamos querer que percam valor. É igualmente muito difícil de entender a meta generalizada de reduzir o valor das casas, pela simples razão de que, se a meta fosse alcançada, no dia seguinte haveria um grave problema nos bancos Portugueses, pois decorrem cerca de 1.500.000 processos de crédito hipotecário (37% de famílias que estão a pagar as suas casas).

Todos sentimos "na pele" as consequências de um problema generalizado na banca. Não traz nada de bom.

A ideologia, ao contrário da racionalidade, é destemida, é um facto. Recentemente, alguns meios de comunicação relataram que limitar a 5.000 euros os serviços imobiliários iria poupar mais de 800 milhões de euros por ano. Gostaria de acrescentar que, limitar a 20 euros por pessoa por dia o valor despendido em alimentação, iria poupar muitos milhões de euros ao Portugueses. Também limitar a 80 euros por ano o valor gasto em vestuário iria gerar enorme poupança. Limitar a 100 km por mês a distância a percorrer por cada um permitiria enormes poupanças e...E a nossa sociedade tal como a conhecemos iria colapsar.

Seria bom assumir com clareza e frontalidade oque se pretende com as anunciadas medidas. Polarizar ideologicamente a sociedade Portuguesa, ou encontrar soluções para as dificuldades encontradas. Polarizar é dividir, é por exemplo dar a entender que em Portugal há muitos proprietários que não querem aumentar as suas casas, são um género de classe social abastada, responsável pelo que se passa.

Em Portugal, a esmagadora maioria dos proprietários tem as suas casas arrendadas porque não se podem dar ao luxo de ficarem sem a “rentabilidade" daquele arrendamento. E, portanto, qualquer coisa que aconteça, não estimula mais ou menos, pois simplesmente precisam de ter as suas casas arrendadas.

Em Portugal, há uma minoria de proprietários que se podem dar ao luxo de não conferir qualquer rentabilidade às suas casas, fazem-no porque não precisam e têm recursos que lhes permitem não o fazerem. Essa minoria que não o fazia, dificilmente o fará agora.

Polarizar é acabar com os Vistos Gold porque sim; é combater o Alojamento local porque sim. Polarizar é dividir aqueles que lutam pelo nosso crescimento e progresso assentes no desenvolvimento económico e os outros que, legitimamente, acreditem em algo diferente.

Quem lidera tem de dar o exemplo, a frase não é do Dalai-Lama, é do
povo. O Estado não pode ter centenas de casas devolutas, ao abandono, um pouco por todo o País. O Estado não deve incentivar a polarização entre quem tem e quem não tem uma casa.

O Estado deve procurar soluções que não empobrecem todos e que tenham a capacidade clara de encontrar soluções habitacionais a quem delas precisa, e depressa.