Hugo Santos Ferreira
Hugo Santos Ferreira
Presidente da APPII

Nova Lei dos Solos: medida positiva, mas insuficiente

29/01/2025

Esta lei é um passo na direção certa, mas insuficiente se aplicada de forma isolada. Apesar de reconhecer a relevância desta iniciativa, é fundamental destacar que, isoladamente, a lei não será capaz de cumprir a promessa de proporcionar habitação acessível aos portugueses.

A razão principal é que a crise da habitação em Portugal não se resume à falta de terrenos para construir, mas também a outros fatores estruturais que permanecem sem solução. Desde a elevada carga fiscal na construção, até aos longos e morosos processos de licenciamento urbanístico, o setor enfrenta vários obstáculos que não podem ser ignorados nem resolvidos com medidas isoladas. Portugal continua a ser o país da Europa com a maior carga fiscal na construção de habitação. Esta realidade contrasta com os nossos vizinhos espanhóis, onde o IVA na construção é dedutível e a taxa para o mercado residencial é de 10%. No nosso país enfrentamos uma taxa de IVA 23% a que se somam os restantes impostos e taxas o que resulta numa carga fiscal efetiva de 40% ou mais... Este peso fiscal é diretamente refletido no preço das casas, tornando-as inacessíveis para a maioria das famílias. Propomos, como há muito defendemos, a implementação de IVA reduzido, ou, em alternativa, a sua dedutibilidade, alinhando-nos com as práticas de outros países europeus. Esta mudança teria um impacto significativo nos custos de construção e, consequentemente, no preço final das casas.

A burocracia é outro grande entrave ao setor. Processos de licenciamento que demoram 5 ou mais anos são absolutamente incompatíveis com a urgência da crise habitacional. Mesmo que tenhamos mais terrenos, as casas continuarão a chegar ao mercado de forma lenta e a preços elevados. É imperativo que se simplifiquem e acelerem os processos de licenciamento, principalmente ao nível das autarquias, que têm um papel crucial na viabilização dos projetos.

Outro ponto crítico que merece reflexão é o impacto desta lei no preço dos terrenos. Embora a transformação de terrenos rústicos em urbanos seja positiva, não existem mecanismos na lei para controlar o aumento do preço dos terrenos que daqui pode advir. É natural que os proprietários de terrenos valorizados tentem maximizar o seu lucro, o que poderá fazer subir os preços no curto prazo. Sem uma regulação que permita adquirir terrenos a preços justos, os promotores imobiliários continuarão a enfrentar dificuldades para construir casas acessíveis, mesmo com mais solos disponíveis.

É necessário destacar a aplicabilidade limitada desta lei. Apesar de ser uma medida pensada para zonas de maior pressão habitacional, como as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, a sua implementação será pouco significativa em muitas destas regiões. A falta de terrenos disponíveis nestas cidades e o cálculo baseado em medianas para definir preços acessíveis restringem a eficácia da medida. 

Esta nova Lei dos Solos é uma medida positiva, mas sozinha, não terá impacto suficiente para resolver a crise habitacional em Portugal. O Governo precisa de ir mais longe. É essencial reduzir a carga fiscal, acelerar os licenciamentos e regulamentar os preços dos terrenos para garantir que os portugueses possam, de facto, ter acesso à habitação que podem pagar. Sem estas medidas complementares, a nova lei será apenas um paliativo numa crise que exige reformas estruturais profundas e corajosas. A nossa missão, enquanto setor imobiliário, é construir para os portugueses. Mas precisamos de condições que viabilizem essa construção. O tempo é crítico, e o custo da inação será suportado pelas famílias, que continuarão a enfrentar preços proibitivos para o sonho de ter uma casa própria.