Hugo Santos Ferreira
Hugo Santos Ferreira
Presidente da APPII

OCDE e a excessiva carga fiscal em Portugal

23/06/2021

Quanto ao IMI, que também foi abordado, já lá iremos. Segundo a OCDE, os impostos sobre as transações “aumentam os custos de mobilidade”, fator que poderia ajudar a “ajustar o mercado”. Do tal relatório resulta ainda impressionante que os “portugueses precisam dos rendimentos de 11 anos para comprar casa de 100 m²”.

Se para muitos isto é uma novidade, para outros nem tanto. Será porventura o nosso caso, pois há muito que esta Associação diz que, além de haver uma bruta carga fiscal sobre o imobiliário com reflexos nos preços das casas, o problema da Habitação tem que ver também com o fraco rendimento das pessoas. Estas são as questões essenciais: fraco e estagnado rendimento das famílias, que não acompanha a valorização dos imóveis e excessiva carga fiscal. Vamos a esta última. Há muito que reclamamos ações concretas e eficazes para combater a brutalidade dos impostos incidentes sobre os ativos imobiliários, com diretas consequências nos preços altos e na falta de mais projetos, nomeadamente de habitação, que gera escassez da oferta e consequentemente um escalar de preços.

Tudo isto fez-me reviver um tema que abordámos aqui, nesta mesma coluna, há cerca de um ano, quando nos questionámos sobre: “Habitação Acessível com 30% de impostos?”. Versando precisamente sobre elevada carga fiscal, fomos comparar os impostos incidentes sobre a aquisição de uma habitação em Portugal e em Espanha, chegando-se à impressionante conclusão: 30% em Portugal – 10% em Espanha.

Em traços gerais, >30% (que vai >40% se lhe somarmos as demais “taxas e taxinhas”) do valor de aquisição de uma habitação em Portugal são impostos, enquanto em Espanha esse valor reduz drasticamente para 10%.

Desde logo, o 23% de IVA não dedutível assume um enorme peso nos investimentos imobiliários, que, no caso de prédios urbanos para habitação, será um custo final a suportar pelo comprador final, uma vez que o promotor não tem hipótese deduzir o IVA pago na construção. Termos um IVA à taxa máxima não dedutível num projeto que visa atribuir habitação às pessoas é caso isolado na Europa, aliás de difícil explicação a qualquer investidor internacional. Acresce que, sobre a venda de prédios urbanos para habitação, incide IMT a taxas progressivas, que poderão atingir 7,5% e ainda Imposto do Selo à taxa de 0,8%.

Daí que pelo menos 30% do valor de aquisição de um imóvel em Portugal sejam impostos (23% IVA + 7,5% IMT+ 0,8% Imposto de Selo). Por comparação, em Espanha a venda de uma habitação tem um nível de tributação muito inferior. Desde logo, a transmissão de prédios urbanos novos para habitação está sujeita à taxa reduzida de IVA a 10%. No entanto, esta incidência permite ao promotor a dedução do IVA incorrido nos custos suportados, o que possibilita a redução dos custos finais repercutidos no comprador final. Mais, a habitação em Espanha não tem IMT.

Há muito que pedimos o que a OCDE vem agora ratificar: uma intervenção legislativa integrada, no sentido da recomposição fiscal necessária ao dinamismo do investimento imobiliário em Habitação, uma vez que o atual fardo de tributação é insustentável, inviabiliza projetos, faz aumentar o valor dos imóveis e retira competitividade. Quando se fala tanto da dificuldade no acesso à habitação, é muito importante, como diz a OCDE, baixar os impostos. E convenhamos que não é preciso “inventar a roda”, basta olhar para o país vizinho, para o Reino Unido, ou os Países Baixos.

Além da necessidade de se acabar com o “imposto mais estúpido do mundo” a SISA, assim qualificava em 2001 o Primeiro-Ministro António Guterres o que é hoje o IMT, um dos outros passos a dar para se criar Habitação Acessível passaria por substituir o IMT por uma taxa reduzida de IVA na transação, permitindo ao promotor deduzir o IVA que suportou anteriormente na construção, o originando assim uma redução dos 30% de impostos incidentes sobre a casa dos portugueses, aproximando-nos mais dos 10% de Espanha.

Já quanto ao IMI, nunca seremos a favor de aumentos, já que não faz sentido tributar alguém pelo simples facto de possuir um imóvel, o que em Portugal a maioria das vezes não é sequer sinonimo de riqueza, tendo em conta os largos anos de congelamento das rendas e a atual inexistência de um mercado de arrendamento que permita aos senhorios obter bons rendimentos. Seremos a favor sim da extinção da maior aberração fiscal, o AIMI. Tributar com um duplo imposto quem tem imóveis ou terrenos para habitação é o mesmo que convidar todos aqueles que querem neles investir, desenvolver ou aí construir a casa dos portugueses a não o fazer.