Hugo Santos Ferreira
Hugo Santos Ferreira
Presidente da APPII

Os Pastéis de Nata e o Lobo

01/11/2023

Entre pacotes, leis e novas medidas, a habitação tem estado na ordem do dia, é um facto, mas será que estamos a olhar do ângulo certo e a caminhar no sentido de resolver o problema, pergunto-me? Esta é a questão sobre a qual me debruço para perceber onde reside realmente o problema da habitação em Portugal. Este tema é já recorrente, mas é ainda mais premente não o deixar arrefecer, por isso escrevo a reflexão de hoje com um olhar descomplicado, tentando explicar a sua verdadeira raiz.

Agora sem retórica e com pura praticidade, convido quem nos lê a olhar para um exemplo muito simples, mas que acredito explicar de forma muito direta o problema da habitação no nosso país. Vamos supor que somos proprietários de uma fábrica de pastéis de nata, onde diariamente a procura por pastéis aumenta de forma exponencial e a produção se mantém igual. Isto vai significar que a um dado momento a quantidade de pastéis de nata produzidos é inferior ao número de clientes que os querem comprar. Ora aqui tenho duas hipóteses: posso vender os pastéis de nata até terminar o stock e dizer aos clientes que ficam sem produto, que simplesmente não tenho mais e sugerir que procurem noutro estabelecimento, possivelmente longe da sua área de conveniência; ou posso aumentar a produção de pastéis de nata respondendo assim ao aumento da procura. Por detrás deste exemplo básico, surge uma noção de mercado também ela muito simples: mais procura e menos oferta, significará naturalmente aumento do preço do produto.

Aqui os meus pastéis de nata são o meu produto, aquele que escasseia e que muitas vezes demoramos a querer perceber onde está a solução. Como no meu exemplo em cima, a resposta é simples: produzir mais para podermos dar resposta à procura e podermos, por outro lado, continuar a vender pastéis de nata a bom preço, baratos e acessíveis a todos.

Mas afinal, nesta história onde entra o lobo? Se por um lado temos uma escassez de produto, por outro temos um lobo que é todo um ambiente hostil de um país que vê nos estrangeiros, nos investidores, nas empresas e nos empresários, mas também na riqueza que consegue atrair de todos os pontos do planeta, como a fonte do mal para todos os seus problemas. Muitas vezes sem perceber que, vivendo o seu povo num país pobre e sem capital suficiente, precisa inevitavelmente de investimento, de mais tecido empresarial capacitado e muito de capital precisamente estrangeiro, para assim trazer mais oferta de produto. Só desta forma conseguirá construir mais fornos para fazer mais pastéis de nata, com escala na produção e por isso com preços mais competitivos.

Voltemos então ao tema da habitação: em Portugal temos poucas casas e uma elevada procura que está a causar pressão no mercado, o que, consequentemente, força a subida dos preços. Aqui, eu vejo o lobo na pele deste país que é Portugal, que ataca hoje, sem precedentes, tudo o que é investimento e mais ainda se for estrangeiro, achando que esse é o responsável por todos os males do País. Ao abrigo de uma pretensa defesa da Habitação, acabando, de forma ideológica, com todo o investimento estrangeiro no nosso País. Como se uma coisa fosse inimiga da outra e ainda como se uma coisa não pudesse ajudar a outra.

Como na fábrica de pastéis de nata, o pasteleiro não tem capacidade para sozinho aumentar a sua produção e o lobo não o deixa recorrer a ajuda externa, assim a produção mantém-se, a procura aumenta e os pastéis de nata sobem de preço, tornam-se num bem escasso e, portanto, caro.

Torna-se então inevitável perguntar, até quando? Precisamos urgentemente de mais medidas que resolvam o problema do lado da oferta. Não restam dúvidas: urge construir mais para podermos oferecer mais barato.