Se, como sempre afirmámos, não compete ao Setor questionar a implementação, por parte do Governo, de uma política pública cultural, já o modelo escolhido para a sua efetivação e o seu impacto nas empresas e na execução dos investimentos, merece-nos uma apreciação claramente desfavorável.
Como tivemos oportunidade de transmitir em sede de discussão deste diploma, o que está em causa é um agravamento dos preços da construção, os quais, recordo, já estão sujeitos a pressões muito significativas, em resultado da falta de mão-de-obra qualificada e da anómala subida dos preços das matérias-primas, da energia e dos materiais de construção. E, apesar de se tratar de um encargo que se soma ao preço base das obras, ou seja, será, em teoria, pago pelo dono de obra, o qual, à partida, escolherá o artista e a respetiva obra de arte, o que é facto é que a responsabilidade da sua contratualização e entrega cabe ao empreiteiro, que somará mais este ónus à já longa lista de encargos e riscos relacionados com a execução da empreitada.
Esta é, portanto, uma iniciativa que tem na sua base objetivos amplamente consensuais, como a promoção e divulgação da cultura em todo o território nacional, mas que é implementada através de canais errados, com as empresas a serem obrigadas a assumir um papel para o qual, claramente, não estão vocacionadas, sendo trazidas para um sistema que nada tem a ver com os processos construtivos, cria novos riscos operacionais e contraria princípios elementares de gestão de obras públicas.
Num momento em que o País enfrenta o desafio coletivo que é assegurar a recuperação sustentada da sua economia e conta, para isso, com o imprescindível papel do investimento público e a necessidade de tirar partido dos fundos europeus que foram colocados à nossa disposição, tanto do Portugal 2020 que se encontra no seu ciclo final, como do PRR – Plano de Recuperação e Resiliência, a prioridade tem de ser a correta calendarização e execução dos projetos, num quadro temporal muito exigente.
Como temos afirmado, o Setor está, como sempre esteve, preparado para responder às necessidades do País. Mas, é necessário salvaguardar a sua competitividade, perante uma conjuntura económica complexa e uma concorrência externa crescente. No âmbito das obras públicas, é prioritário assegurar estabilidade nas decisões, criar instrumentos como um fundo nacional, que permita aos donos de obra pública fazer face a variações significativas e excecionais de preços nas empreitadas quando a sua dotação financeira não for suficiente, definir corretamente os preços base dos concursos, promover a capacitação das empresas e a reorientação da formação profissional. A promoção da cultura é uma responsabilidade do Estado que não pode ser delegada, ainda que apenas na sua operacionalização, nas empresas do Setor.