A convergência inédita de cinco associações representativas de proprietários (ALP), mediadores (APEMIP), promotores (APPII), construtores (AICCOPN) e investidores imobiliários (APFIP) é, por isso, um marco maior: a perceção de que só um compromisso transversal pode devolver ao arrendamento a centralidade que um país com tanta procura e tão escassa oferta exige.
A crise do acesso à habitação não começou no último ano, nem decorre apenas de conjunturas económicas. Resultado de uma sucessão de escolhas políticas erráticas, acabou por gerar um mercado de arrendamento vulnerável e incapaz de responder às necessidades reais das famílias. Nesta realidade, as propostas agora apresentadas – assentes na segurança jurídica, no equilíbrio contratual e no estímulo fiscal – procuram devolver confiança a quem investe, e previsibilidade a quem arrenda. Confiar é o que decide se os proprietários colocam as casas no mercado ou as deixam fechadas.
A ideia de que o direito à habitação pode ser assegurado sacrificando unilateralmente uma das partes mostrou-se falaciosa. A história recente provou que medidas punitivas, congelamentos e incerteza legislativa apenas afastam investidores e retraem proprietários, sobretudo os pequenos, que representam a esmagadora maioria. Quando o Estado transfere para cidadãos a responsabilidade social de suportar rendas artificialmente baixas, não protege os inquilinos e acaba por empurrar a oferta para fora do mercado.
As medidas apresentadas pelas associações recorrem a uma lógica distinta: estabelecer regras claras. Um regime de arrendamento previsível, acompanhado de mecanismos céleres de resolução de incumprimentos, é essencial para que o risco seja mensurável e não um salto no escuro.
Num país com um stock habitacional envelhecido e milhares de imóveis devolutos, a política pública deve contribuir para ativar estes ativos e reforçar o parque habitacional destinado a arrendamento. Não basta pedir ao setor privado “mais casas”. É necessário criar incentivos reais para que essas casas existam. Programas fiscais que isentem a construção dedicada ao arrendamento e a incorporação de instrumentos de poupança coletiva podem gerar escala e atrair investimento estável. A habitação pública, tantas vezes prometida, tem igualmente de regressar com ambição.
Contudo, e naturalmente, a dimensão social da habitação não vai desaparecer. Pelo contrário, fica mais sólida quando o seu financiamento não assenta em proprietários individuais, mas em políticas estruturadas que protegem quem arrenda através de modelos de apoio direto ou seguros de renda. Um regime de garantia pública, inspirado em experiências europeias, pode abrir portas a jovens e famílias que não dispõem de histórico ou capital inicial, o que reduz tensões e preconceitos.
A união destas cinco entidades é, acima de tudo, um gesto político no melhor sentido do termo. É afirmar que a superação da crise habitacional não se faz pela fragmentação, nem pela desconfiança recíproca, mas por um compromisso pragmático e pluripartidário. Ao unir vozes que, tantas vezes, o debate público coloca em campos opostos, abre-se uma oportunidade rara: transformar a discussão sobre arrendamento num pacto nacional que reconcilie quem investe, quem constrói e quem procura um lugar digno para viver. Esse é o verdadeiro ponto de partida. E é nele que devemos insistir.



