Que estranhamente é o de substituir o investimento público a todo o investimento privado, limitando-o e não o incentivando, parecendo até querer afastar os investidores privados da oferta de Habitação. Tal parece ser uma vitamina ideológica, já que este estímulo não catalisa diretamente as empresas privadas, que precisam de se reinventar para se tornarem mais competitivas e resilientes no cenário pós-pandemia.
E o pior é que tal substituição do Estado às empresas não se resume ao imobiliário, sendo uma generalidade do PRR. É nas empresas que está a economia, porque é aqui que assenta a competitividade e resiliência de um país. Se o que pretendemos é uma recuperação económica sustentável, assente em crescimentos económicos, então o PRR deveria prever precisamente o inverso!
Em concreto na dinamização da Habitação, o que vemos é falta de investimento estratégico a longo prazo. O PRR limita-se a um conjunto de medidas de curtíssimo prazo, apenas com o objetivo de suprir as necessidades imediatas de um pós-pandemia e de sobrevivência de um Estado em necessidade. A oferta pública de Habitação é bem-vinda, mas não chega para colmatar a carência habitacional em Portugal. Urge dinamizar também a capacidade dos privados em colocar mais habitação acessível. Note-se por exemplo no caso do apoio ao Arrendamento Acessível, o PRR apenas prevê a reabilitação de edificado público e só através de investimento público. Não se prevê qualquer tipo de apoio para os privados promoverem Arrendamento Acessível?
E, portanto, fica a pergunta: todo este dinheiro vai para o sector público? Mas porquê?
O PRR tinha obrigação de criar todas as condições para atrair e incentivar a iniciativa privada, nomeadamente na colocação de mais habitação acessível, tanto pela via da aquisição como do arrendamento, de modo a conseguir maior volume de investimento e com isso obter maior oferta de habitação. Esperar-se-ia também encontrar formas de financiamento verde à construção de habitação, tudo em perfeita consonância com as diretrizes do Pacto Ecológico Europeu (European Greal Deal, Horizonte Europa, Next Generation), mas estranhamente quanto a isto também nem uma palavra.
A situação é pior se considerarmos que os investidores privados estão excluídos dos programas de apoio à Reabilitação de Edifícios (nomeadamente, da ELPRE – Estratégia de Longo Prazo para a Reabilitação do Edificado, que está incluída no PRR): é um erro, que julgamos de legalidade e constitucionalidade duvidosa, sendo difícil sustentar esta discriminação do apoio, em função da natureza do proprietário. Se se tratar de investimento público tem acesso a fundos comunitários, inclusive a fundo perdido, mas se for privado, o acesso está-lhe vedado. Dá que pensar do tipo de Estado que estamos a criar, que se substitui às empresas, ao mercado e que esvazia a economia.
Por fim, preocupa-nos que estejamos a falar de um grande montante - €750 milhões - de investimento, com dinheiros públicos e portanto de todos nós e para o qual não são apresentadas métricas, planos de medição, de sucesso e muito menos planos de negócios para a sua construção, gestão e manutenção. Já todos vimos isto acontecer no passado e correu mal. O Estado não pode voltar a cair no mesmo erro e pretender substituir-se aos privados na construção de Habitação, a história já se encarregou de dar vários exemplos de enormes falhanços nessa estratégia.