Andreia Candeias Mousinho
Andreia Candeias Mousinho
Associada da WIRE e Sócia de Urbanismo da PLMJ – Sociedade de Advogados

O Simplex Urbanístico e a teoria do cubo de Rubik

28/02/2024

Conta a história que apenas se percebeu que se tinha concebido um quebra-cabeças, quando, pela primeira vez, se baralhou e tentou resolver o cubo. Ernõ Rubik demorou 1 mês para o ordenar novamente. O cubo rapidamente foi divulgado, dando aso à elaboração de teorias e métodos da sua compreensão e resolução.

No embalo do PRR e do Pacote Mais Habitação, o Simplex Urbanístico surge com o propósito (não novo) de reformar e simplificar os procedimentos urbanísticos.

E de cubo mágico como ferramenta de agilização, passamos ao cubo mágico como quebra-cabeças. 

Duas dificuldades apresentam-se, assim que começamos a tentar movimentar o cubo: os momentos de entrada em vigor das alterações, e a aplicação aos procedimentos iniciados antes da sua entrada em vigor. 

Não menos desafiador, encontramos no Simplex Urbanístico um leque substancial de operações urbanísticas que sai da gaveta do procedimento mais burocrático e menos célere que é o licenciamento, para as gavetas da mera comunicação prévia ou mesmo da total isenção de procedimento. Também são eliminados momentos procedimentais e procedimentos aparentemente não necessários, e é redefinido o papel dos atores no território, retirando, por um lado, poderes de apreciação aos municípios e, por outro, conferindo um aumento da responsabilidade privada, técnica e financeira sobre as opções e soluções urbanísticas a implementar. 

No rescaldo do novo regime, muitos são os dilemas e muitas são as problemáticas legais que convidam à ponderação e reclamam orientação. Contudo, o tempo urge, imperando abordar o Simplex não como um quebra-cabeças, mas de modo pragmático e reconhecedor da oportunidade por si criada. Como uma ferramenta.

Mais do que alterar a lei, o Simplex vem alterar mentalidades, trazendo para o palco da atualidade o urbanismo e o território, e espicaçando os players do setor à revisão de práticas, aos diálogos concertadores, sem tabus ou dogmas, e ao aprofundamento e balizamento das responsabilidades (por exemplo na tradicional exigência por entidades financiadoras, por investidores, ou pelo particular que compra, da validação municipal da legalidade da operação urbanística - que deixa de existir). 

Os interesses são comuns: não se quer ser força de bloqueio ao desenvolvimento urbanístico do (e no) território. Não o querem as entidades financiadoras, os municípios, as ordens profissionais ou os promotores. Ao contrário: todos querem ter cidades sustentáveis, territórios inteligentes e um aproveitamento e valorização de recursos adequados.

Já se leu que o cubo mágico é diabolicamente difícil, gerador de impaciências e eminentemente “atirável”. Não obstante, é a história que comprova que o barulho das peças que rodam e prometem a reorganização das cores, não só tem prevalecido, como trouxe consigo uma panóplia de benefícios cientificamente apontados.