Carlos Suaréz
Carlos Suaréz
Administrador da VICTORIA Seguros

Todas as maratonas começam com um passo… Neste caso, com dois.

19/07/2023

Poder-se-á dizer, claro, que a correção de rumo do partido no governo em matéria do plano de intervenção “Mais Habitação” não é suficiente, que as propostas da oposição não foram devidamente avaliadas e que as alterações à Proposta de Lei 71/XV/1, agora em votação na especialidade, não vão ao encontro do pretendido… mas, na minha opinião, há, pelos menos, duas retificações que apontam no sentido certo.

Assim, diria eu, é possível identificar como uma boa alteração a incorporação, no âmbito dos apoios à promoção de habitação para arrendamento acessível, das entidades que se dediquem à promoção e ao investimento imobiliário. Recorde-se que, na primeira versão apresentada, se identificavam como beneficiários do referido apoio às cooperativas de habitação e construção, as sociedades comerciais que se dediquem à construção civil – em consórcio ou sob outra forma de associação com sociedades comerciais cujo objeto social inclua o arrendamento para habitação e a gestão de património – os municípios, as Misericórdias, IPSS, etc… Deixando de fora os promotores e investidores imobiliários. Assim, também eles passam a poder beneficiar da linha de financiamento e da cedência de terrenos e edifícios públicos.

Por outra parte, e por falar em cedências, também deve ser interpretado como um avanço positivo a correção correspondente ao prazo e natureza da afetação do património imobiliário público (cedência do direito de superfície). Se na proposta original se asseverava que não seria permitida a transferência da propriedade plena para os beneficiários e que o prazo máximo da transmissão era de noventa anos, a posição agora adotada admite a transmissibilidade do direito de superfície e a extensão, mediante acordo entre as partes, do prazo de cessão. Naturalmente, esta nova proposta pressupõe a afetação dos fogos à promoção de habitação a custos controlados para arrendamento acessível e o direito de preferência dos municípios e o IHRU na aquisição dos fogos promovidos, em caso de venda.

Os pontos anteriores poderão ser interpretados como alterações pouco significativas ao programa Mais Habitação, nomeadamente quando comparados com outros assuntos porventura mais quentes (como as exigências em matéria de alojamento local, o arrendamento coercivo, a fiscalidade insuficiente ou o cálculo de apoio às rendas), mas todas as maratonas começam com um passo… e, neste caso, até se começa com dois. Não serei eu quem diga que está tudo certo com a Proposta de Lei 71/XV/1 – bem longe disso –, nem que as iniciativas de alteração legislativa da oposição não merecem bastante mais consideração e maior cabimento em sede de discussão parlamentar, mas que ela está melhor com as alterações supramencionadas – oferecidas pelo partido do governo após o debate público – isso, não tenho dúvidas que está.

No fim do dia, o que me parece ser mais importante, neste momento, é que se consiga avançar qualquer coisa – mesmo com um mínimo comum denominador e não com consensos totais (convém não esquecer que o governo está alicerçado na sua maioria) –, numa matéria que preocupa, já há demasiado tempo, a demasiados portugueses. As alterações à Proposta de Lei 71/XV/1 não são perfeitas, concordo, mas, às vezes, creio eu, é preferível o possível ao pretendido.

Muito melhor escrito por Voltaire… “le mieux est l’ennemi du bien.”

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