Hugo Santos Ferreira
Hugo Santos Ferreira
Presidente da APPII

Vamos todos discutir a Habitação

12/05/2021

Que seja um bom augúrio e o prenúncio de que o tema da Habitação vai passar ser tratado de forma pensada, auscultados todos os interesses em presença e acima de tudo que os documentos e iniciativas que dali saírem possam dar frutos efetivos, já que os anteriores "pacotes" da Habitação resultaram em pequenas caixas vazias, sem qualquer conteúdo prático visível, com especial prejuízo para as famílias portuguesas, que continuaram a não ter uma casa para viver condigna, adequada às suas capacidades e necessidades.

A panóplia de legislação em matéria de Habitação criada até então pecou em muitos aspetos, aliás percetível pela ausência de efeitos no mercado residencial nacional, mas em especial porque não foi precedida dos necessários estudos de impacto, análises de mercado e porque tão pouco foram ouvidos os stakeholders, as associações, as empresas, os empresários, profissionais e pessoas que fazem parte do "ecossistema" da Habitação, em todas as suas vertentes, tanto na construção nova, como na reabilitação, como na venda ou no arrendamento. Assim, a criação deste Conselho Nacional tem, para já, a grande virtude de pretender ouvir tudo e todos, dando espaço e tempo para que todos se possam pronunciar e só isso já é positivo.

Podemos, pelo nosso lado, dizer que a APPII e os promotores imobiliários estão fortemente empenhados na concretização deste desígnio nacional, que é o da eliminação ou mitigação da carência habitacional em Portugal e anseiam poder viabilizar mais e mais projetos para construir a casa dos portugueses.

Por outro lado, notamos ainda com especial regozijo a criação, na semana passada, do Conselho Municipal da Habitação de Setúbal, do qual a APPII é Conselheiro Permanente. Parabéns a Setúbal por este passo. É um sinal de que não só o Estado central deve estar preocupado com a Habitação, mas também as autarquias devem ativamente atuar, a montante e a jusante, para resolver este problema à escala nacional, que é o da escassez de oferta habitacional e consequentemente do aumento dos preços do imobiliário.

E este é o ponto essencial. A grande problemática do tema Habitação tem que ver precisamente com o aumento dos preços e a principal razão para os preços altos surge quando há mais procura que oferta. É aqui que temos de trabalhar, sempre do lado da oferta e não do lado da procura, como até agora se pretendeu fazer e que não tem surtido os efeitos pretendidos. Bem pelo contrário. Veja-se inclusive o caso de Berlim, onde se congelaram as rendas nos edifícios anteriores a 2014, beneficiando apenas quem já vivia nesses fogos, o que provocou um enorme aumento de rendas nos restantes apartamentos e uma enorme redução de oferta. Erro crasso.

Temos de nos focar em aumentar a oferta e para isso é urgente disponibilizar mais matéria-prima (edifícios para reabilitar e terrenos para construir), por exemplo com a disponibilização do vasto património público, vendido a privados de forma condicionada, dedicado à construção de habitação acessível e para o arrendamento acessível, com programas simples, claros e que permitam o desenvolvimento de projetos economicamente viáveis. Mas também há que dinamizar a urbanização de terrenos públicos expectantes nas cidades, de modo a aumentar a oferta de terrenos nestas centralidades mais pressionadas pela escassez e consequentemente aumento dos preços. Temos também de continuar a reduzir o tempo e simplificar os licenciamentos urbanístico, caso contrário, o “produto” torna-se escasso e por isso de maior valor. Temos ainda de criar um ambiente propício ao investimento, com enquadramento jurídico-fiscal atrativo e duradouro, se possível almejando pela criação de um pacto de regime ao nível legislativo e fiscal parlamentar e interpartidário (concretização difícil para o status quo político de hoje, bem sei, mas não podemos deixar de exigir isso aos nossos políticos), que seja estável, credível, duradouro e, nomeadamente em matéria de arrendamento, que permita aos investidores acreditar na legislação e prática legislativa do nosso País. E por fim, não podemos deixar de melhorar o tempo de resposta e atuação da nossa justiça.

Com medidas públicas certas, conseguiremos uma grande atração de investimento como sucedeu na Reabilitação Urbana desde 2014, onde o Estado não teve que colocar um Euro. Assim e para além de certamente resolvermos o problema habitacional, teremos ainda um forte motor de dinamização e recuperação económica do País num cenário pós-Pandemia.